O STF (Supremo Tribunal Federal) não criou uma lei que propõe cassar o mandato de candidatos cristãos eleitos, como diz um vídeo que circula nas redes sociais (veja aqui). Não existe norma aprovada ou projeto de lei semelhante em tramitação no Brasil. O vídeo tira de contexto uma reportagem sobre uma lei da Bolívia que não proíbe cristãos de se candidatar, mas veda o recrutamento forçado de pessoas por entidades religiosas, e adiciona um protesto de uma advogada brasileira em julgamento sem relação com o caso.
As postagens enganosas contam com ao menos 17.383 interações no TikTok e 12.500 visualizações no Instagram nesta sexta-feira (29).
[Lei] pode provocar uma verdadeira caçada aos cristãos. A lei que entrará em vigor em 1 ano e meio prevê a criminalização daqueles que propagam a fala de Deus. O TSE poderá cassar todos os candidatos cristãos que forem eleitos, pois acabou de inventar o crime de abuso de poder religioso (...).
Não existe uma lei que permite cassar todos os candidatos cristãos eleitos, como afirmam postagens nas redes sociais. O Aos Fatos não encontrou, nos sites da Câmara dos Deputados ou do Senado, qualquer projeto ou texto legal que tenha esse objetivo. O vídeo que traz a informação enganosa é uma montagem que mescla uma reportagem e um discurso que não têm relação com uma eventual proibição de candidaturas cristãs no Brasil.
A montagem começa com um vídeo que foi publicado originalmente na página do Facebook da RIT TV, emissora vinculada à Igreja Internacional da Graça de Deus, em 11 de janeiro de 2018. Nele, dois apresentadores criticam uma lei que, na opinião deles, irá perseguir cristãos. “A lei que entrará em vigor em um ano e meio prevê a criminalização daqueles que propagam a fala de Deus”, dizem no trecho, que dura dez segundos. A medida criticada, entretanto, foi promulgada na Bolívia, não no Brasil.
O governo boliviano havia proposto um artigo na reforma do código penal que considerava crime o recrutamento de pessoas para participação em conflitos armados, organizações religiosas ou de culto. A medida foi interpretada por religiosos como uma censura à evangelização cristã. Ainda em janeiro, o então presidente Evo Morales desistiu da norma.
Na segunda parte da montagem, é usado um vídeo da advogada Lenice Moreira publicado em sua página pessoal no Facebook no dia 1º de julho de 2020. Ela diz, de forma enganosa, que o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) poderá cassar todos os candidatos cristãos que forem eleitos. A alegação é baseada em uma reportagem da Veja publicada em junho de 2020 sobre uma proposta de Edson Fachin, ministro do STF e atual presidente do TSE, de cassar mandatos em caso de “abuso de poder religioso”.
A corte julgava o caso de uma vereadora eleita em 2016, na cidade de Luziânia (GO), que tinha a candidatura contestada por ter usado a sua posição de pastora da igreja evangélica Assembleia de Deus para obter votos. A parlamentar não foi cassada por não haver provas suficientes para condená-la e o TSE rejeitou a possibilidade de instituir o “abuso de poder religioso” nas ações que investigam candidaturas de 2020 em diante.
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