O ex-primeiro-ministro do Japão Shinzo Abe, assassinado a tiros em 8 de julho, não implementou ações durante a pandemia contra a vacina e a favor do uso da ivermectina, conforme é dito nas redes (veja aqui). O imunizante foi autorizado no país em fevereiro de 2021, quando Abe já não estava no poder. As cerca de 1,6 milhão de doses da vacina barradas, citadas na postagem, apresentavam contaminação. Por fim, a ivermectina não é autorizada para prevenir ou tratar a Covid-19 no país, que não obriga qualquer tipo de vacinação desde 1994.
As postagens enganosas contam com ao menos 5.420 visualizações no Telegram e dezenas de compartilhamentos no Facebook nesta quarta-feira (20).
Ministro japonês assassinado não seguia ordens do FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL. Não obrigou vacinação, (...)
Postagens enganam ao associar o assassinato a tiros do ex-primeiro-ministro do Japão Shinzo Abe (1954–2022), em 8 de julho, a supostas atitudes tomadas pelo político durante a pandemia de Covid-19. Perfis antivacina e defensores de tratamentos sem respaldo científico têm disseminado nas redes sociais, principalmente no Telegram, que o político agiu contra a vacinação e a favor do uso de ivermectina, o que é falso.
A primeira afirmação diz que Abe não obrigou a população do Japão a se vacinar contra Covid-19, mas ele já não era mais premiê quando foi iniciada a imunização no país. Durante a pandemia, Abe alegou problemas de saúde e deixou o cargo em agosto de 2020, quando nenhuma vacina contra a Covid-19 havia sido liberada. O primeiro país a iniciar a imunização foi o Reino Unido, em dezembro daquele ano. O Japão autorizou a primeira vacina, a da Pfizer, em fevereiro de 2021.
Além disso, nenhuma imunização é obrigatória no Japão desde 1994. Na época em que a lei foi revisada, Abe fazia parte da Câmara dos Representantes, que integra o Legislativo.
O Japão nunca interrompeu a campanha e atualmente está vacinando contra a Covid-19 pessoas a partir de cinco anos de idade. Dados de 18 de julho do Our World in Data, projeto da Universidade de Oxford, na Inglaterra, mosta que 82,2% da população está com o esquema vacinal primário completo. Para efeito de comparação, no Brasil, essa taxa é de 79%. Os imunizantes disponíveis no país são os da Pfizer, Moderna, AstraZeneca e Novavax.
(...) devolveu 1,6 milhões de doses de volta (...)
É verdade que o governo japonês rejeitou 1,6 milhão de doses de imunizantes contra Covid-19, mas o caso ocorreu quando Abe não estava no poder e não tem relação com algum tipo de rejeição a campanhas de imunização. Em agosto de 2021, o Ministério da Saúde japonês suspendeu o uso de alguns lotes da Moderna que poderiam estar contaminados.
Em outubro, a farmacêutica Takeda, responsável pela importação e distribuição da Moderna no Japão, anunciou que os lotes haviam sido contaminados com partículas de aço inoxídavel por “erro humano”. Segundo a empresa, a contaminação ocorreu na fabricante espanhola Rovi nas máquinas que colocam as tampas nos frascos das vacinas.
(...) e deu ivermectina aos cidadãos. ISSO FAZ SENTIDO AGORA?
As postagens ainda enganam ao afirmar que Abe distribuiu ivermectina à população. O antiparasitário não faz parte da relação de medicamentos autorizados no país para tratar a Covid-19. Não há notícias de que Abe tenha defendido a substância.
Em maio de 2020, o Japão autorizou o uso emergencial do remdesivir para casos graves. Em 2021, foram autorizados os remédios baricitinibe, também para pacientes em estado grave, casirivimab, sotrovimabe e molnupiravir, indicados para a fase inicial da doença. Neste ano, houve autorização para o uso do tocilizumabe para tratar quem teve a doença agravada, e o paxlovid para tratamento nos primeiros dias de contaminação.
A ivermectina continua sem eficácia comprovada para prevenir ou tratar pessoas contaminadas com Covid-19. Uma metanálise (análise de resultados de pesquisas) atualizada em junho pela Cochrane, entidade especializada em revisões, mostrou que as conclusões existentes até o momento não sustentam a eficácia e a segurança do antiparasitário para a doença viral. Ao todo, 41 ensaios clínicos ainda estão em andamento para averiguar o potencial do medicamento.
Tetsuya Yamagami, homem que atirou em Abe, disse que cometeu o crime por ter rancor de uma instituição religiosa que havia pressionado a mãe dele a fazer doações de grandes quantias em dinheiro. Yamagami acreditava que Abe havia favorecido a organização no Japão.
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