Perfis críticos ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) dominaram a discussão no Twitter sobre o discurso do presidente na Assembleia Geral da ONU, na terça-feira (22), mostra análise do Radar Aos Fatos feita a partir de dados coletados em parceria com o Labic-Ufes (Laboratório de Estudos sobre Imagem e Cibercultura da Universidade Federal do Espírito Santo).
A coleta identificou que 183.690 usuários interagiram, gerando 597.297 retweets publicados durante toda a terça-feira.
Foi possível identificar três grandes grupos de discussão, ilustrados na imagem abaixo:
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Azul: crítico a Bolsonaro, o grupo repreendeu as tentativas do presidente de responsabilizar outros atores por problemas como as queimadas e a pandemia de Covid-19, além de acusá-lo de disseminar desinformação. Nesse universo também há posts de veículos de imprensa que noticiaram e checaram o discurso, como o Aos Fatos;
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Vermelho: perfis que criticaram principalmente a menção à “cristofobia” no discurso do presidente — ou seja, a ideia, defendida por Bolsonaro, de que cristãos são perseguidos por causa de sua religião. Há ainda questionamentos ao presidente por ter dito que o governo concedeu auxílio emergencial em parcelas que somam US$ 1.000.
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Verde: reúne a rede bolsonarista. Além dos elogios ao tom do discurso, os perfis direcionaram críticas ao alerta de que Bolsonaro teria inflacionado o valor pago do auxílio emergencial e comemoraram a referência à "cristofobia".
Somados, os dois grupos críticos (azul e vermelho) reuniram cerca de 75% dos posts sobre o discurso de Bolsonaro, contra pouco mais de 20% dos posts reunidos no grande grupo que elogiou e defendeu o presidente (verde). O restante dos tweets ficou pulverizado entre grupos menores.
O grafo foi construído a partir de um algoritmo que agrupou perfis de acordo com a similaridade do discurso e o padrão de compartilhamento de conteúdo. Cada conjunto possui atores que tiveram maior ou menor impacto na rede. Quanto maior o nó, mais retweets aquele ator recebeu e, consequentemente, mais presença na rede.
Grupo azul (41,28% dos tweets)
Este foi o maior grupo no Twitter na discussão sobre o discurso do presidente. Uma análise dos 100 tweets mais compartilhados na rede azul mostra que 44% deles reprovaram os dados apresentados por Bolsonaro e o acusaram de disseminar desinformação.
Entre os integrantes deste grupo, Bolsonaro foi acusado de tentar jogar a responsabilidade pelo controle da pandemia e das queimadas na Amazônia e no Pantanal para outros atores da sociedade. O tweet mais compartilhado do grupo azul, publicado pelo deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ), abordou este tema:
A postura do presidente diante da comunidade internacional, com falas direcionadas ao seu eleitorado, também foi alvo de críticas. Mensagens desse tipo, como esta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tiveram 20% de presença na rede azul:
A imprensa também teve peso relevante neste grupo — 13% dos tweets mais retuitados foram de veículos como o Aos Fatos, The Intercept Brasil, Estadão e O Globo.
Outros temas como cristofobia e humor, respectivamente, tiveram 15% e 7% de ocorrências.
A fala do presidente sobre o auxílio emergencial também foi alvo de críticas. Bolsonaro afirmou ter distribuído pelo menos US$ 1.000 para cada brasileiro beneficiado pelo programa de renda provisório, o que foi questionado pela imprensa e por usuários da rede social.
Grupo vermelho (34,23%)
No grupo vermelho, a crítica à menção de Bolsonaro à “cristofobia” foi o tema mais presente nos 100 posts mais retweetados, aparecendo em 37% deles.
Também apareceram com frequência tweets em que Bolsonaro é acusado de propagar desinformação na ONU (30%), geralmente associados a críticas aos trechos do discurso sobre o auxílio emergencial (assunto de 24% dos posts analisados), queimadas (19%) e indígenas (13%). Mais de um assunto pode ter aparecido em um mesmo tweet.
Como o Aos Fatos mostrou na checagem do discurso de Bolsonaro, o presidente deu declarações falsas sobre o fogo na Amazônia e fez uma afirmação insustentável sobre o suposto envolvimento de indígenas com as queimadas.
Todos os 100 tweets analisados dentro deste grupo apresentaram críticas ao discurso de Bolsonaro na ONU, e quase metade deles (41%) o fez usando o humor — ou seja, uma crítica por meio de um meme ou de um texto irônico, por exemplo.
Grupo verde (20,97%)
O grupo verde se caracteriza pelo apoio a Bolsonaro e teve como destaque mensagens em defesa ao discurso do presidente — 58% dos 100 tweets analisados. Desse universo, a mensagem que mais repercutiu foi um tweet do usuário @taoquei1:
Nessas mensagens, também houve ataques à pressão internacional pela preservação do meio ambiente, à OMS (Organização Mundial da Saúde) e ao “globalismo”, como demonstra esse tweet do colunista Rodrigo Constantino.
No grupo verde, sobressaíram-se também as mensagens de apoio à menção do presidente à suposta “cristofobia” no discurso à ONU. Entre as publicações, 15% endossaram a denúncia de que há preconceito contra as religiões cristãs.
O conteúdo que mais repercutiu sobre este tema foi uma publicação do assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, Filipe Martins.
Na tônica da repercussão da rede bolsonarista, destacaram-se ainda as críticas a quem repreendeu a declaração de Bolsonaro sobre o auxílio emergencial (9%). Um tweet de Constantino foi o que teve o maior número de interações:
Links mais compartilhados. Entre todos os tweets, o link para o discurso no YouTube figurou como a URL mais compartilhada. O canal oficial do presidente no YouTube foi difundido em 6.130 publicações.
Em seguida, o portal UOL Notícias aparece com 1.019 compartilhamentos com a notícia “Organização aponta 'mentiras' em discurso de Bolsonaro na ONU”, sobre a checagem feita pelo Observatório do Clima em relação ao compromisso do governo brasileiro com a preservação do meio ambiente. E com 902 compartilhamentos, a análise dos comentaristas do programa 3 em 1, da Jovem Pan, com destaque para a fala de Rodrigo Constantino, figura em terceiro sob o título “Constantino: ‘Bolsonaro mostrou que Brasil tem um presidente que não se curva’”.