🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Abril de 2020. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Cotado para Saúde, Osmar Terra é o congressista que mais publicou desinformação sobre Covid-19 no Twitter

Por Bruno Fávero e Marina Gama Cubas

15 de abril de 2020, 10h30

Cotado para o Ministério da Saúde com o apoio de bolsonaristas que se opõem a medidas de isolamento social, o deputado e ex-ministro Osmar Terra (MDB-RS) é o parlamentar que mais difundiu desinformação sobre o novo coronavírus no Twitter desde que a pandemia chegou ao Brasil, mostra levantamento do Radar Aos Fatos.

A análise considerou os 1.500 tweets sobre o assunto (veja todos aqui) com mais interações (retweets e curtidas) publicados por membros da Câmara dos Deputados e do Senado (incluindo suplentes e licenciados) entre 20 de fevereiro e 8 de abril. No total, foram encontradas 159 postagens com desinformação veiculadas por 22 parlamentares e que somavam cerca de 1,58 milhão de interações no período.

Terra foi, sozinho, responsável por 38 desses posts (23,9%) e 522.485 dessas interações (32,9%). Em seguida, aparecem como maiores difusores de desinformação os deputados Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), cujas publicações enganosas tiveram 18% das interações, e Bia Kicis (PSL-DF), com 10%.

Dezenove dos 22 deputados e senadores que publicaram tweets com desinformação são da base do governo Bolsonaro (12 do PSL, ex-partido do presidente, e outros sete de PSC, Republicanos, Podemos, PSD e, no caso de Osmar Terra, MDB). As exceções são três deputados do PT: Margarida Salomão (MG), Paulo Pimenta (RS) e Bohn Gass (RS).

Discurso alinhado

Não surpreende, portanto, que as postagens enganosas sigam um padrão similar ao do discurso do presidente: os temas mais abordados foram o questionamento das medidas de isolamento, a propaganda da cloroquina como cura para a infecção pelo novo coronavírus e a comparação equivocada da Covid-19 com a gripe, três tópicos de desinformação que Bolsonaro aborda com frequência ao falar da doença.

As críticas ao isolamento foram impulsionadas principalmente pelas publicações de Osmar Terra. O ex-ministro da Cidadania se tornou, nas últimas semanas, uma das principais vozes do bolsonarismo contra as medidas recomendadas pelo Ministério da Saúde e por autoridades de todo o mundo. Seu nome tem circulado como possível substituto do ministro Luís Henrique Mandetta, que defende o distanciamento social e entrou em conflito aberto com Bolsonaro por isso.

Em seu Twitter, Terra tem distorcido a interpretação de dados oficiais e feito afirmações que contradizem as evidências científicas disponíveis para se opor ao distanciamento. Sem apresentar evidências, ele disse, por exemplo, que a quarentena fez aumentar o contágio por Covid-19 na Itália, contradizendo as conclusões de estudos recentes no país que apontam para uma diminuição no ritmo de contato justamente em decorrência das medidas adotadas. Também afirmou erroneamente que a Holanda conseguiu controlar a pandemia sem fechar lojas – na verdade, o país determinou o fechamento de uma série de estabelecimentos.

O segundo tema que mais apareceu nas peças de desinformação foi o uso de cloroquina e hidroxicloroquina. As substâncias são estudadas como possíveis tratamentos contra a Covid-19, mas não tiveram sua eficácia comprovada cientificamente. Apesar disso, o presidente Jair Bolsonaro e parlamentares de sua base têm feito propaganda da droga como solução para a pandemia.

No levantamento do Aos Fatos, foram consideradas como desinformação publicações claramente falsas – como as que afirmam que a eficácia do remédio já é comprovada – e também posts que descontextualizam uma informação verdadeira – por exemplo, que comemoram a cura de um paciente que tomou cloroquina, mas não explicam que o medicamento ainda está em testes.

O deputado Eduardo Bolsonaro é o parlamentar cujos tweets com desinformação sobre o assunto mais somaram interações. No exemplo abaixo, ele mostra casos pontuais de pacientes que tomaram hidroxicloroquina e se curaram da Covid-19 e diz que a droga "cada vez mais demonstra sua eficácia". O deputado omite, contudo, que estudos sobre o remédio ainda estão em andamento e que não se pode ter certeza de que os casos a que se refere realmente se curaram por causa da cloroquina.


Na esquerda. Entre parlamentares de oposição, houve duas peças de desinformação com engajamento relevante. A primeira é que Cuba havia desenvolvido uma vacina para o novo coronavírus – o que não aconteceu. O conteúdo enganoso foi compartilhado pelos deputados Margarida Salomão (PT-MG) e Bohn Gass (PT-RS).

A segunda, compartilhada por Paulo Pimenta (PT-RS), é que o presidente americano Donald Trump seria sócio de uma fabricante de hidroxicloroquina. Trump de fato tem dinheiro investido em um fundo com participação na farmacêutica francesa Sanofi, que produz a droga. Segundo a Forbes, porém, os títulos de Trump na empresas somam menos de US$ 3 mil.

Minoria barulhenta

As discussões sobre a pandemia do novo coronavírus têm dominado o Twitter dos parlamentares desde o começo, de março, como é possível ver no gráfico abaixo.

O levantamento mostra que a maior parte do conteúdo analisado não tem desinformação, mas também que posts com conteúdo enganoso, em média, geram mais engajamento do que os informativos.

Dos 1.500 tweets analisados, 1.341 (ou 89,4%) não continham desinformação e, em média, esse grupo somou de 6.837 interações por tweet. Já as publicações com desinformação foram apenas 159 (10,6%), mas geraram 9.988 retweets e curtidas cada uma, 46% a mais.

A disparidade é especialmente grande para alguns parlamentares. A deputada Carolina de Toni (PSL-SC) teve média de 4.873 interações nos 14 tweets sem desinformação que compartilhou e de 17.130 retweets e curtidas nas postagens com conteúdo enganoso, diferença de 251%. Já o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), teve média de 7.271 interações em tweets informativos e de 19.359 com desinformação.

Metodologia. O Radar Aos Fatos coletou pela API do Twitter todos os tweets publicados de 20 de fevereiro a 8 de abril por 597 contas de deputados e senadores. Os endereços foram obtidos em parceria com o 7c0, um projeto que registra a atividade de agentes políticos em redes sociais para evitar que conteúdos deletados sejam perdidos.

Do banco de dados gerado, doram selecionadas apenas publicações que mencionavam um dos 45 itens de uma lista termos relacionados à Covid-19. Os 1.500 tweets desse grupo que tinham mais interações (soma de retweets e curtidas) foram analisados individualmente e receberam um selo caso contivessem desinformação. As contas e tweets analisados, assim como as palavras-chave usadas para filtrar os dados podem ser acessadas aqui.

Reações

Parte dos deputados que foram citados nesta reportagem criticaram o Aos Fatos em suas redes sociais.

O deputado e ex-ministro Osmar Terra (MDB-RS) afirmou no Twitter que "As publicações da esquerda agora viraram as donas da verdade com poder de julgar quem delas discorda, taxando todas as opiniões contrárias de fake news. Aonde chegou a manipulação esquerdista. E ainda tem gente que as leva a sério..!!".

A deputada Carolina de Toni (PSL-SC) escreveu que "A agência 'Aos Fatos' classifica como desinformação as publicações favoráveis à hidroxicloroquina e ao isolamento seletivo, mas, para mim, a experiência de médicos renomados do mundo todo e as publicações científicas valem mais do que a opinião das agências de Fact-Checking".

O deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) disse que "Estar na lista do Aos Fatos como "desinformantes" é a certeza de que estamos no caminho certo. Me preocuparia muito se fôssemos classificados de outra forma pela extrema imprensa e suas agências que habitam o universo bizarro do oposto à verdade."

A deputada Alê Silva (PSL-MG) não citou diretamente a reportagem, mas publicou em seu Twitter que "divergência de opinião não é desinformação. A opinião é minha, a conclusão é de quem lê. Vida que segue".

O único parlamentar da oposição citado pela matéria que se manifestou foi o deputado Bohn Gass (PT-RS), que publicou uma correção da desinformação apontada pelo Aos Fatos. "CORREÇÃO: não pretendi, nem pretendo espalhar fakes. Ainda mais sobre uma pandemia. Então, corrijo: o medicamento que foi anunciado como 'vacina' contra covid-19, da fabricação cubana é, na verdade, um antiviral. Tem sido usado para tratar, não para prevenir a doença".

Os deputados Margarida Salomão (PT-MG) e Paulo Pimenta (PT-RS), também citados, compartilharam a reportagem em suas contas no Twitter, mas não comentaram sobre suas postagens apontadas como desinformação.

Referências:

1. Aos Fatos 1, 2, 3 e 4
2. Folha de S.Paulo 1 e 2
3. Revista piauí
4. Twitter (@OsmarTerra)
5. Twitter


Este texto foi atualizado às 17h10 para incluir as reações de deputados citados pela reportagem.

De acordo com nossos esforços para alcançar mais pessoas com informação verificada, Aos Fatos libera esta reportagem para livre republicação com atribuição de crédito e link para este site.

sobre o

Radar Aos Fatos faz o monitoramento do ecossistema de desinformação brasileiro e, aliado à ciência de dados e à metodologia de checagem do Aos Fatos, traz diagnósticos precisos sobre campanhas coordenadas e conteúdos enganosos nas redes.

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