O dólar americano alcançou na manhã desta quinta-feira (19) a marca dos R$ 6,30, maior valor nominal (não reajustado pela inflação) da história. O recorde ocorre em meio a um cenário de descrença do mercado financeiro com o pacote de ajuste fiscal do governo Lula e de inflação e patamar elevado de juros nos Estados Unidos, que aumentaram a valorização da moeda americana no mundo.
As medidas para corte de gastos propostas pelo governo estão reunidas em três projetos — o PLP 210/2024, já aprovado pela Câmara, o PL 4.614/2024 e a PEC 45/2024 — que, segundo o Ministério da Fazenda, devem poupar R$ 70 bilhões em até dois anos.
Desde o anúncio, em novembro, analistas de instituições financeiras expressam ceticismo quanto à eficácia das propostas. A possibilidade de que o Congresso altere os textos e aprove um ajuste menos rigoroso também contribui para a desvalorização do real perante o dólar.
Uma das principais dúvidas dos consumidores é como a cotação elevada pode gerar impactos no dia a dia. Aos Fatos explica, a seguir, como a alta do dólar encarece os preços de produtos e causa uma reação em cadeia que envolve:

1. Exportações e importações
A desvalorização do real frente à moeda americana influencia os mercados de exportação e importação de diversas maneiras:
- Mercadorias vendidas tanto no mercado interno como no externo — como é o caso dos produtos agrícolas — costumam aumentar de preço. Isso acontece porque fica mais lucrativo exportar do que vender no mercado brasileiro. Com a queda na oferta interna, os preços sobem;
- São exemplos de produtos que acabam sendo mais exportados: carnes, café, arroz e soja;
- O preço da importação de produtos em geral também aumenta e, com isso, setores muito dependentes de peças e insumos estrangeiros, como o automotivo e o farmacêutico, acabam aumentando o preço final;
- Um exemplo comum é o preço do pão: como o trigo é uma matéria-prima importada, alimentos compostos por farinha de trigo ficam mais caros.
2. Transportes
Como o barril de petróleo é cotado em dólar, o preço dos combustíveis fósseis também é influenciado pela variação da moeda americana.
O aumento do preço da gasolina e de outros derivados do petróleo, por sua vez, acaba encarecendo o preço do frete, já que, no Brasil, cerca de 65% do transporte de cargas é feito por caminhões. Como as transportadoras repassam esse valor ao consumidor final, o preço dos produtos aumenta como consequência.
3. Alimentação
Como explicado nos tópicos anteriores, diversos alimentos vendidos no mercado interno podem ficar mais caros, seja por conta do valor do frete, do aumento nos custos de importação de matérias-primas ou do crescimento das exportações e da consequente queda de oferta no mercado interno.
A alta do petróleo também impacta no preço dos alimentos, que são em sua maioria embalados com plástico, material produzido a partir do recurso. A substância também é usada na produção de fertilizantes agrícolas, como a ureia.
4. Inflação
Em resumo, portanto, a alta do dólar acaba gerando inflação, que é o aumento dos custos de produtos e serviços essenciais. Isso acontece porque os setores que mais influenciam a disparada dos preços são o de alimentos e bebidas (21%) e o de transportes (20%), que são sensíveis à variação da cotação da moeda americana.
A inflação, por sua vez, reduz o poder de compra das famílias, em especial da população mais pobre, cuja renda é destinada prioritariamente ao consumo de itens básicos.
5. Juros
A alta do dólar também pode acarretar no aumento da taxa básica de juros (Selic), determinada pelo Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central. Como a cotação elevada é acompanhada pelo aumento da inflação, o BC eleva os juros para desacelerar o consumo e a produção numa tentativa de evitar o aumento rápido dos preços.
Na semana passada, inclusive, o Copom decidiu aumentar a taxa Selic para 12,25%. Na ata da reunião, divulgada na última terça-feira (17), o colegiado cita como um dos motivos para o crescimento do índice a cotação elevada do dólar.
O caminho da apuração
Aos Fatos consultou reportagens sobre a votação do pacote fiscal e como ela se relaciona com a alta recente do dólar. Também procuramos informações oficiais divulgadas pelo Copom.
A reportagem ainda buscou dados oficiais do IBGE e do Banco Central para contextualizar os apontamentos do texto.