O declínio da política de coalizão do governo Dilma Rousseff chega a seu clímax nesta semana, com a saída do PMDB da base aliada, mas o início da desintegração do apoio ao Palácio do Planalto na Câmara remonta a 2011, primeiro ano de mandato da petista.
Um estudo de 2013 do departamento de Ciência Política da Universidade de Salamanca mostra que a chamada "faxina ministerial" de Dilma foi decisiva para as sucessivas derrotas governistas na Câmara nos anos seguintes — em especial a primeira e mais estridente delas: a aprovação do Código Florestal. Desde então, a base nunca mais voltou à unidade vista no início de 2011.
Segundo a jornalista Ana Freitas, mestre em Estudos da América Latina em Salamanca e colaboradora de Aos Fatos, a redução da coalizão governista tem início já em 2011, com o desgaste da estratégia do Planalto de distribuição de cargos em ministérios. Embora Dilma tivesse maior coalização que Luiz Inácio Lula da Silva, sua degradação foi acelerada.
"Sucessivas acusações de corrupção em seus primeiros meses de governo fizeram a presidente demitir e trocar integrantes de ministérios e secretarias, além de adotar um estilo de governar mais técnico e menos político em comparação ao seu antecessor", diz o estudo.
Freitas demonstra que, em fevereiro de 2011, início daquela legislatura, Dilma contava com o apoio de 388 deputados — ou 75,6% dos 513 integrantes da Câmara. "Em comparação com o primeiro mandato de Lula, Dilma assumiu o poder com 52,7% mais deputados do que seu antecessor. Com relação ao segundo mandato de Lula, o aumento foi de 9,9% no número de deputados."
Um ano depois, o PR, uma das siglas atingidas pelos casos de corrupção, deixara o governo. Também naquele ano foi criado o PSD, que se declarava independente e que arrebanhou políticos de partidos aliados ao Planalto. Na chamada "faxina ministerial", sete ministros deixaram seus cargos após denúncias. No total, 62 deputados (16%) deixaram a coalizão do governo, que passou a 326 representantes.
Deputados na coalizão do governo Dilma Rousseff
O estudo mostra que, nas 81 votações nominais que ocorreram na Câmara em 2011, 97% dos deputados da base aliada obedeceram as orientações do Planalto em 76% dos casos.
Em 2012, o governo já encontrava dificuldades em prever votações, o que, juntamente com as eleições municipais, fez com que a quantidade de matérias analisadas em plenário fosse reduzida drasticamente. A Câmara votou apenas 49 projetos no período. Os deputados da base continuaram seguindo a orientação do Planalto em 74% dos casos, porém, o mapa de adesões ficou mais fragmentado.
A virada do governo na Câmara deu-se com a votação do Código Florestal, em 2012. O estudo narra que, em 2011, o governo fez um acordo com congressistas para que aprovassem o texto sem um artigo que reduzia as zonas de proteção florestal em montanhas. Na Câmara, 410 deputados votaram a favor, 64, contra.
No dia seguinte, deputados votaram uma emenda ao projeto que tratava exatamente dessas zonas de proteção. Então, 274 deputados votaram contra o governo, incluindo integrantes da base.
O projeto foi remetido ao Senado, onde sofreu mudanças. De volta à Câmara, para nova votação, o texto passou por novas alterações e foi aprovado em 25 de abril de 2012, numa versão que concedia mais anistias a desmatadores do que o governo inicialmente tinha combinado.
"Na votação, 274 deputados votaram contra o governo, ou seja, a favor da nova proposta do código. 184 deputados seguiram a orientação do Planalto. Dos 317 deputados da coalizão governista que estavam presentes no plenário, somente 131 votaram segundo o governo. Os demais 53 que votaram contra eram de partidos independentes ou de oposição", diz a pesquisa.
Freitas lembra que somente três partidos obedeceram integralmente a orientação presidencial: PRB, PTC e PSL. "Já o partido mais infiel foi justamente o mais importante da coalizão depois do PT: o PMDB. Apenas 3 de seus 78 deputados presentes seguiram a orientação presidencial."
Conforme Freitas, a acelerada decomposição do governo na Câmara também se deve, além da "faxina" e seus desdobramentos, à insegurança de aliados em relação ao perfil gerencial de Dilma e à retenção de emendas parlamentares. "Além da queda no número de integrantes de 388 para 326, a fidelidade dos partidos se esgarçou", diz.