Marcada para esta terça-feira (3), a votação na comissão temporária de inteligência artificial do Senado do projeto de regulação foi adiada mais uma vez, para a próxima quinta (5). A decisão foi tomada por conta da apresentação de dezenas de emendas de última hora — manobra para postergar a votação também usada por parlamentares em julho.
O relator do projeto, senador Eduardo Gomes (PL-TO), recebeu 49 emendas desde o dia 28 de novembro. A maioria chegou na tarde de segunda-feira (2), prazo para o envio de sugestões.
Mesmo com o prazo apertado, todos os textos foram analisados:
- 32 foram rejeitados;
- 13 foram parcialmente acatados;
- e apenas quatro foram aceitos por completo.
Entre as mudanças está a retirada dos modelos de IA para recomendação automática de conteúdos do rol de sistemas de alto risco. A proposta altera o entendimento sobre algoritmos de redes sociais, que fornecem sugestões de conteúdo.
A sugestão é uma das pautas defendidas pelo lobby do setor privado e foi proposta pelos senadores de oposição Marcos Rogério (PL-RO), Mecias de Jesus (Republicanos-RR) e Izalci Lucas (PL-DF).
Repetindo argumentos de uma campanha desinformativa que já havia sido impulsionada contra o projeto em junho, as emendas de Jesus e Lucas — que tinham justificativas idênticas — alegaram que a inclusão dos algoritmos na lista de alto risco “poderia resultar em um controle excessivo sobre a liberdade de expressão”.
Na verdade, a categorização como alto risco apenas sujeitaria os sistemas a exigências de transparência e à realização de auditorias. O processo seria coordenado por um órgão multisetorial de regulação, o SIA (Sistema Nacional de Regulação de Inteligência Artificial), e respeitaria segredos industriais.
“A colocação dessas plataformas de sistemas de recomendação dentro do alto risco garantiria o mínimo de transparência desses algoritmos, de como esses sistemas funcionam, e que eles funcionem de acordo com a proteção dos direitos fundamentais, o que é algo que a sociedade como um todo deveria querer. Isso não tem nada a ver com diminuir a liberdade de expressão”, afirmou ao Aos Fatos a porta-voz da Coalizão Direitos na Rede, Paula Guedes.
O argumento de defesa da liberdade, no entanto, foi ressaltado pelo senador Eduardo Gomes em sua complementação de voto, apresentada nesta terça (3). Segundo ele, “a garantia da liberdade de expressão apresenta-se como premissa básica a qualquer sociedade democrática e o texto ora relatado jamais poderia ser utilizado para afetar essa prerrogativa”.
A mudança também foi repudiada através de nota pelo Idec (Instituto Brasileiro de Defesa de Consumidores. “A cada nova versão do projeto, mais direitos são retirados e mais cresce o apoio das grandes empresas de tecnologia ao texto. Isso reflete a força do lobby dessas corporações, que têm conseguido moldar o PL para favorecer seus interesses comerciais.”
O adiamento da votação e a mudança no relatório final atende a interesses de big techs, que usam o argumento da proteção à liberdade de expressão para criticar discussões sobre regulação tanto no Congresso quanto no Supremo.
“Tirando as plataformas deste inciso do alto risco, elas ficam mais uma vez fora de leis que tentam criar regras para elas. É muito preocupante que elas saiam de mais esse projeto”, afirmou Guedes.
O caminho da apuração
Aos Fatos acompanhou acompanhou, pelo canal da TV Senado, a reunião da CTIA de 3 de dezembro e analisou as emendas recebidas ao PL 2.338/2023 nos últimos dias.
A reportagem também contextualizou a tramitação do projeto de regulação frente ao lobby de setores interessados.
