O ex-ministro Ciro Gomes afirmou em um vídeo veiculado em sua página no Facebook, em 17 de abril passado, que "o governo federal está entregando quase metade do orçamento público" com a chamada "rolagem da dívida". Com 55 mil visualizações, o vídeo simplifica com um gráfico as despesas do Orçamento federal e, a pedido de um leitor, Aos Fatos se debruçou sobre o assunto para checar a veracidade da afirmação do político cearense.
Com base em informações que constam da lei que rege o Orçamento da União de 2017, Aos Fatos classificou a afirmação de Gomes como EXAGERADA. Entenda por que abaixo.
O governo federal está entregando quase metade, metade de todo o orçamento público para o pagamento de juros e serviços da dívida. A outra metade se divide entre a Previdência, na maior parte, e cerca de 1/3 para tudo mais. — Ciro Gomes (PDT-CE)
A afirmação de Ciro no vídeo “Chega de privatizar o Brasil” é ilustrada com um infográfico em formato de pizza. A peça mostra uma fatia, equivalente a 48%, destinada à "rolagem da dívida" — ou seja, à manobra de adiar o pagamento de títulos vencidos através da contratação de novos títulos — , de modo a ilustrar seu impacto na totalidade do Orçamento federal.
De acordo com o Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2017, a despesa total fixada para o ano é de cerca de R$ 3,5 trilhões. Esse montante inclui o chamado Orçamento Fiscal (que mantém toda a estrutura federal, inclusive pagamento de juros e dívida), o Orçamento de Seguridade Social (como benefícios sociais e Previdência) e, à parte, o refinanciamento da dívida pública federal.
No último item é que está a confusão.
Segundo definição do Tesouro Nacional, a dívida pública federal "é a dívida contraída pelo Tesouro Nacional para financiar o déficit orçamentário do governo federal, nele incluído o refinanciamento da própria dívida, bem como para realizar operações com finalidades específicas definidas em lei".
A despesa total com a dívida pública federal, em 2017, será de R$ 1,7 trilhão. Isso, grosso modo, corresponderia a 48% do orçamento fixado para o ano. Mas a questão não é tão simples.
Esse montante inclui o refinanciamento da dívida, na ordem de R$ 950 bilhões — ou seja, dinheiro que o governo tomará emprestado com a finalidade de pagar parte do que é devido.
Ou seja, como o governo tomará emprestado dinheiro com a única finalidade de rolar parte da dívida, o que sairá efetivamente do Orçamento Fiscal serão R$ 775,9 bilhões — uma quantia significativa, sem dúvida, porém não de 48%, conforme diz Gomes. O valor, em vez disso, equivale a 22% do Orçamento total.
Não à toa, o governo faz questão de diferenciar no projeto de lei orçamentária os R$ 946,4 bilhões para refinanciamento da dívida.
Isso significa que, mesmo se for desconsiderado o refinanciamento da dívida na conta do Orçamento, e levando em conta apenas o Orçamento Fiscal e o Orçamento de Seguridade Social, esses recursos para o pagamento da dívida representariam pouco mais de 30% do total do que o governo efetivamente desembolsa. Simplicando: o governo não está "entregando" nada, já que parte do dinheiro não é dele nem sai dos seus cofres.
Selo. Embora, de fato, se somadas as duas fontes de recursos, o pagamento de dívida represente “quase metade” do orçamento total para 2017, Aos Fatos dá o selo de EXAGERADO à afirmação de Gomes. O ex-ministro omitiu o fato de que a maior parte dos recursos não sairá efetivamente do Orçamento para manutenção do governo e investimentos, e sim da contratação de novos títulos para rolar a dívida pública.
Para entender melhor a questão do refinanciamento da dívida pública federal frente ao Orçamento, acesse o documento "O Orçamento e a Dívida Pública Federal", do Tesouro Nacional.
Texto atualizado às 19h52 de 2 de maio de 2017 para acrescentar o último parágrafo, com referência ao artigo do Tesouro Nacional.