Cinco fatos sobre a ditadura militar

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Às vésperas dos 55 anos do golpe militar de 1964, o presidente Jair Bolsonaro determinou ao Ministério da Defesa nesta semana a realização de "comemorações devidas" ao movimento que depôs o presidente João Goulart e instaurou uma ditadura no país até 1985.

O ato resgatou o debate sobre memória e verdade nos anos do regime militar, bem como ensejou argumentos que tentam rever a história ao negar que houve golpe ou ditadura, como fizeram o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e o próprio presidente Bolsonaro em mais de uma ocasião.

Abaixo, desenhamos e explicamos cinco fatos sobre a ditadura militar no Brasil.


1. Sob a prerrogativa do AI-2 (Ato Institucional nº 2), o Congresso Nacional foi fechado três vezes durante o período militar. A primeira foi em outubro de 1966, quando o presidente Castelo Branco decretou recesso por um mês para conter um “agrupamento de elementos contra-revolucionários” que teria se formado no Poder Legislativo.

O segundo recesso foi instaurado em dezembro de 1968, quando o presidente Costa e Silva baixou o AI-5 para combater a subversão e as “ideologias contrárias às tradições de nosso povo”.

O pretexto dos militares para a edição desse ato institucional foi um discurso do então deputado Márcio Moreira Alves na Câmara aconselhando o povo a não participar das festividades de 7 de setembro. Pressionada pelos militares, a Câmara rejeitou o pedido de cassação do deputado. O AI-5 veio em seguida, como retaliação, cassando vários políticos.

A última vez que o Congresso foi fechado aconteceu no governo de Ernesto Geisel, em 1977, por duas semanas, após os deputados (principalmente do MDB) terem rejeitado uma emenda constitucional.

Na maior parte do período militar, o Congresso foi mantido em funcionamento, como forma de dar um ar de normalidade institucional. Porém, as limitações do Poder Legislativo frente aos militares eram evidentes, segundo os historiadores, demonstrando o caráter de regime autoritário que vigorava no país. Entre 1964 e 1985, 168 deputados tiveram mandatos cassados. Só o Ato Institucional nº 1, editado dez dias após o golpe, ceifou os mandatos de 40 parlamentares.

2. As altas taxas de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) caracterizam o período de 1967 a 1973 como "milagre econômico brasileiro". Nesses anos, a taxa que mede a soma de todas as riquezas produzidas pelo país girou na média de 10,2%, chegando a 12,5% entre 1971 e 1973.

Ainda que tenha suscitado grandes investimentos em infraestrutura e geração de empregos, o crescimento não se traduziu em distribuição de renda. Como resultado, a desigualdade cresceu no país. Segundo o livro A ditadura que mudou o Brasil (Zahar), o fenômeno ocorreu devido a uma política salarial restritiva que impedia a transferência dos ganhos de produtividade para os trabalhadores. Em 1960, antes da ditadura, o índice de Gini, que é utilizado para medir a concentração de renda de um país, estava em 0,54. O indicador subiu para 0,63 em 1977 (quanto mais perto de 1, mais desigual).

3. Durante a ditadura militar, o arrocho salarial foi aplicado pelo governo como forma de garantir o controle da inflação, de acordo com o artigo A Beginner's Guide to Brazilian Economic Idiosyncrasies, publicado na SAIS Europe Journal. Funcionava assim: o governo reajustava os salários abaixo da inflação (gerando perda no poder de compra dos trabalhadores). Com isso, os custos de produção eram reduzidos e, consequentemente, o preço final também caía.

A desvalorização arbitrária dos salários só era possível por métodos autocráticos de governo e pela inexistência de mecanismos independentes em defesa dos trabalhadores, como sindicatos livres. Os que existiam estavam sob intervenção de aliados do regime militar.

Com a crise do petróleo em 1973, houve uma mudança no cenário externo de bonança, sob o qual estava calcado a política econômica do "milagre econômico", que era muito dependente de empréstimos internacionais. Ainda assim, o governo militar manteve os investimentos, o que provocou descontrole fiscal, com aumento das despesas públicas (em 1984, a dívida representava 54% do PIB; em 1964, era 15,7%) e da inflação nos anos derradeiros da ditadura. A conta ficou para os governantes do regime democrático, que assumiram, em 1985, com inflação de até 223%.

4. Em seu relatório final, a CNV (Comissão Nacional da Verdade) expôs que 434 pessoas morreram ou estão desaparecidas em decorrência de perseguições de agentes do Estado no regime militar. Desse total, 224 são mortes confirmadas. O número, no entanto, pode ser maior se considerados a extensão territorial do Brasil, a ausência de compilação estatística rigorosa e os familiares que não prestaram queixa.

Para se ter uma ideia, de acordo com uma reportagem do Amazônia Real, ao menos 8.350 indígenas teriam sido mortos em massacres, esbulho de suas terras, remoções forçadas de seus territórios, contágio por doenças infecto-contagiosas, prisões, torturas e maus tratos durante a ditadura militar.

5. Entre 1964 e 1977, 6.016 denúncias de torturas foram feitas por 1.843 pessoas, segundo documentos do projeto Brasil Nunca Mais. O número, no entanto, pode ser ainda maior: levantamento da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos da SEDH-PR, publicado em 2010 no Programa Nacional de Direitos Humanos, estima que cerca de 20 mil brasileiros foram submetidos a torturas durante a ditadura.

Não apenas civis foram perseguidos, torturados ou mortos. Segundo o relatório da CNV, a ditadura também atingiu 6.591 militares.

Diversas técnicas de tortura foram relatadas por torturados e torturadores à comissão da verdade, incluindo introdução de besouros vivos nas gargantas ou ânus, choques elétricos, empalação com cassetetes embebidos de pimenta, estupros e o “pau de arara”, que compõe a ilustração acima.

Colaboraram Ana Rita Cunha e Bernardo Moura

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