O plano de governo do presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) foi publicado nesta quarta-feira (10) no site do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com alegações falsas já propagadas pelo mandatário e por sua gestão. O documento engana ao indicar que o governo ampliou a transparência federal e infla o número de leis que beneficiam mulheres, por exemplo.
Confira abaixo o que verificamos.
(...) em um governo que já se mostrou ético e continuará nessa direção como algo inegociável, que combate a corrupção e não tem medo de mostrar seus atos, todos baseados nos marcos regulatórios.
A informação neste trecho do programa de governo não procede porque, ao longo de três anos e meio, Bolsonaro promoveu diversas medidas que reduziram a transparência do governo e o acesso a dados públicos.
Logo no início do mandato, em janeiro de 2019, o presidente editou um decreto que alterou a Lei de Acesso à Informação para ampliar a lista de autoridades que poderiam classificar informações como secretas e ultrassecretas. A norma foi posteriormente revogada por pressão do Congresso.
Órgãos do governo também impediram o acesso público a uma série de informações sobre a figura do presidente ou de aliados próximos. Foram impostos, por exemplo, sigilos sobre a carteira de vacinação de Bolsonaro, sobre os testes de Covid-19 feitos por ele e o acesso de seus filhos ao Palácio do Planalto.
Também foram colocados como sigilosos um processo interno do Exército contra o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello por participação em ato com o presidente; os registros de visitas ao Planalto de Valdemar Costa Neto, presidente do PL, e dos encontros do presidente com os pastores envolvidos em um suposto esquema de favorecimento no MEC (Ministério da Educação).
As medidas se estendem ainda aos gastos públicos: 98% dos gastos do cartão corporativo também são mantidos em sigilo.
Com base na LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), o governo federal também restringiu o acesso à base de dados, como a ”lista suja” do trabalho escravo, e informações do Censo Escolar e do Enem.
No atual governo, até o mês de julho de 2022, foram editadas 70 leis de defesa, proteção e promoção da mulher.
É FALSO que o governo de Jair Bolsonaro sancionou 70 leis de defesa, proteção e promoção da mulher. Em levantamento feito no DOU (Diário Oficial da União), o Aos Fatos encontrou 41 normas que beneficiam a população feminina desde janeiro de 2019. Nenhuma delas foi proposta pelo Poder Executivo e 21 foram apresentadas durante a atual legislatura, sendo sete de autoria de parlamentares que compõem a base do governo.
Dentre os 41 projetos ratificados pelo presidente, quatro foram vetados total ou parcialmente no momento da sanção. Um deles é o PL 4968/2019, que institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual. Apesar da orientação dos partidos aliados do governo na Câmara dos Deputados a favor da medida, a distribuição gratuita de absorventes higiênicos foi proibida pelo Poder Executivo. O veto, contudo, foi posteriormente derrubado pelo Congresso.
Entre os projetos de maior destaque apresentados e aprovados na atual legislatura estão a Lei Mariana Ferrer, que pune atos contra a dignidade da vítima e de testemunhas durante processos judiciais, de autoria da deputada Lídice da Mata (PSB-BA) e outros parlamentares; o PL 598/2019, que inclui conteúdo de prevenção à violência contra a mulher em currículos da educação básica, do senador Plínio Valério (PSDB-AM); e o PL 1369/2019, que tipifica o crime de perseguição, da senadora Leila Barros (PDT-DF).
Além das 41 normas que beneficiam especificamente as mulheres, Aos Fatos encontrou outras 12 leis que contêm trechos voltados ao público feminino. Na Lei Aldir Blanc, por exemplo, há a previsão de duas cotas de renda emergencial para trabalhadoras da cultura que sustentam famílias sozinhas. Já a norma que instituiu os programas Auxílio Brasil e Alimenta Brasil prevê pagamento preferencial às mulheres.
[O Brasil é] responsável pela segurança alimentar de 1 bilhão de pessoas (...)
A produção agropecuária brasileira não alimenta 1 bilhão de pessoas no mundo, como afirma o plano de governo. Um estudo publicado pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) em março de 2021 estima que a produção e a exportação de grãos e de carne bovina brasileiras foram responsáveis por alimentar 772,6 milhões de pessoas em 2020.
Os números são ligeiramente maiores do que os obtidos pelos pesquisadores ao analisar bases de dados de outras organizações. Segundo o levantamento, dados da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) mostram que 628,2 milhões de pessoas se beneficiam da produção agropecuária brasileira. Já para o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, o número seria de 625 milhões. Por fim, o IGC (International Grains Council) aponta que seriam 636,9 milhões de pessoas.
Por meio do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), foram titulados 326 mil assentados em três anos. Essa titularização de terras nos assentamentos foi maior na atual gestão que nos dez anos anteriores.
É FALSO que o número de títulos de propriedade rural concedidos pelo governo Bolsonaro seja maior do que nos dez anos anteriores. Segundo o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) informou ao Aos Fatos, foram distribuídos 369.636 títulos entre janeiro de 2019 e 15 de julho de 2022. Já entre 2009 e 2018, as gestões de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) emitiram 453.622 títulos provisórios e definitivos.
O documento não especifica qual o período de três anos referido para chegar à soma de 326 mil assentados. Se considerados os três primeiros anos de governo (2019 a 2021), foram 280.107 títulos de propriedade rural provisórios e definitivos. Se considerados os três últimos (2020 a 2022, até 15 de julho), o índice é maior do que o referido no documento: 338.167.
Não faltaram agulhas e seringas.
Ao citar os números da vacinação contra a Covid-19 no Brasil, o plano de governo de Bolsonaro afirma que não faltaram agulhas e seringas. Isso é FALSO, pois o problema foi constatado no início da campanha de imunização.
Por meio de um ofício enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal), em janeiro de 2021, o Ministério da Saúde informou que o governo federal não possuía estoque disponível de agulhas e seringas para a quantidade de doses encomendadas naquele momento. Na ocasião, a pasta ponderou que a compra e distribuição desses materiais seria obrigação dos governos estaduais.
O Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde) afirmou, em agosto de 2021, que Bahia, Alagoas, Pará e Distrito Federal enfrentavam falta de seringas compatíveis com a vacina da Pfizer para a Covid-19. Na mesma época, o Mato Grosso alegou que seringas de 1 ml — utilizadas para aplicar o imunizante da Pfizer — estavam em falta no mercado nacional.
A escassez de seringas também afetou a campanha de vacinação de outras doenças. Em Feira de Santana (BA), a falta do insumo prejudicou a aplicação da vacina BCG. Em maio de 2022, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal orientou que a imunização de crianças fosse feita com seringas para adultos.
Em nota técnica obtida pelo Metrópoles, a secretaria alegou que três pregões eletrônicos falharam, porque as amostras enviadas pelos fabricantes foram reprovadas, mas que as seringas enviadas pelo Ministério da Saúde também não eram suficientes para atender a atual demanda infantil.
(...) fazendo com que o total de empregos formais esteja próximo de 42 milhões de empregos em junho de 2022, um recorde desde o início da série do Caged, em 1992
Números divulgados pelo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) em junho deste ano de fato apontam que o Brasil tem atualmente um estoque de 42.013.146 empregos formais. A base de dados, entretanto, sofreu mudanças metodológicas em janeiro de 2020, e não é possível afirmar, com base nos dados disponíveis, que esse saldo é o maior registrado desde 1992.
Em janeiro de 2020, o Caged passou a considerar outras fontes e a captar mais dados, além da pesquisa mensal realizada com empregadores. Atualmente, são usadas informações fiscais, previdenciárias e trabalhistas da plataforma eSocial e demissões e pedidos de seguro-desemprego do sistema EmpregadorWeb. Isso faz com que trabalhadores temporários, cujo registro era opcional até 2020, sejam contabilizados hoje com maior precisão.
Esta checagem foi atualizada em 12 de agosto de 2022 para detalhar a origem das leis voltadas para as mulheres aprovadas no atual mandato.