O debate da Band ocorrido na noite da última quinta-feira (8) marca o primeiro embate entre os cinco principais postulantes à Prefeitura do Rio de Janeiro. Participaram do evento o prefeito Eduardo Paes (PSD), líder das pesquisas de opinião, os deputados federais Alexandre Ramagem (PL), Tarcísio Motta (PSOL) e Marcelo Queiroz (PP) e o deputado estadual Rodrigo Amorim (União Brasil).
Aos Fatos transcreveu o debate por meio da ferramenta Escriba e analisou as declarações de cada um dos pré-candidatos. Veja abaixo o que checamos:
Eduardo Paes
“Nós tivemos quase 90% dos nossos compromissos cumpridos.”
Paes faz referência a um monitoramento do g1 sobre suas promessas de campanha que já havia citado em outras ocasiões. O prefeito, no entanto, distorce os dados apresentados pelo veículo, que mostram que foram cumpridos integralmente apenas 23 das 47 promessas da campanha de 2020 — ou seja, 48,94%, e não 90% do total. Por isso, a declaração é FALSA.
O monitoramento também aponta que 18 promessas foram parcialmente cumpridas até o momento, o que representa 38,3% do total. Somando as duas categorias, o percentual chega a 87,24%, valor próximo ao citado pelo prefeito.
Entre as promessas cumpridas estão a diminuição do IPTU, a expansão da educação em tempo integral para 100 mil alunos e a restauração de linhas de ônibus abandonadas. Foram consideradas parcialmente cumpridas promessas como a de ofertar 3.000 novas vagas em centros de acolhimento e de reduzir crimes em 20% até 2023 (o percentual ficou em 17,48%).
Ainda de acordo com o levantamento, o prefeito não cumpriu seis promessas, entre elas a padronização limites de velocidade e a inauguração do metrô da Gávea.
O levantamento foi citado pelo prefeito durante entrevista ao podcast Desenrola, Rio, do próprio g1, na última segunda-feira (5). Na ocasião, Paes citou o dado correto ao dizer que ficou feliz com o percentual de 90% de promessas cumpridas ou parcialmente cumpridas.
“Hoje o orçamento de educação é de R$ 9,5 bi. Ele é 50% maior do que era quando eu assumi a Prefeitura do Rio de Janeiro em 2021.”
O orçamento previsto para a Secretaria de Educação na LOA (Lei Orçamentária Anual) de 2024 é de R$ 9,44 bilhões, valor próximo ao citado por Paes. Esse montante, no entanto, é apenas 6,5% maior do que a soma prevista para 2021, o que torna a declaração FALSA.
Naquele ano, a LOA previa um montante de R$ 8,84 bilhões para a Secretaria de Educação, em valores corrigidos pelo IPCA. Dessa soma, foram executados — ou seja, gastos de fato — R$ 6,47 bilhões.
Também é importante destacar que o montante destinado à Secretaria de Educação em 2024 é proporcionalmente menor do que o reservado em 2021. Neste ano, a verba prevista para a pasta representa 20,65% de todo o orçamento do município. Em 2021, a proporção era de 22,57%.
Alexandre Ramagem
“O Brasil bateu recorde de aquisição de vacina [durante a pandemia de Covid-19]”
Para defender a atuação da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no combate à Covid-19, Ramagem afirmou que o Brasil foi o país que mais adquiriu vacinas contra a doença. Diversos motivos tornam a declaração FALSA:
- Aos Fatos não encontrou bases de dados públicas que permitam verificar qual país comprou mais vacinas no mundo;
- A comparação sobre índices de imunização geralmente é feita analisando as taxas de vacinação a cada cem habitantes. Nesse quesito, o Brasil nunca foi o país que mais vacinou;
- A fala de Ramagem ainda omite que, no início da pandemia, Bolsonaro se recusou a comprar vacinas que poderiam ter sido entregues ainda em 2020. O ex-presidente também se posicionou publicamente em diversas ocasiões contra a imunização.
Comparando os dados disponíveis no portal Our World in Data, é possível verificar que, entre 2020 e 2022, o Brasil nunca ocupou a dianteira em campanhas de imunização contra a Covid-19. O país vacinou sua população em ritmo mais lento, por exemplo, do que diversas nações que compõem a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), como mostra o gráfico abaixo.
Ao final do governo Bolsonaro, em dezembro de 2022, o Brasil ocupava a 42ª posição no ranking de imunização contra a Covid-19, com 223 doses aplicadas a cada cem pessoas.
“A empresa que construiu a ciclovia voltou a contratar com a prefeitura. Pegou a obra da estação Leopoldina para ganhar R$ 136 milhões.”
A Prefeitura do Rio não pagou R$ 136 milhões para a empreiteira Concrejato — integrante do consórcio responsável pela construção da Ciclovia Tim Maia, que desabou em 2016 — restaurar a Estação Leopoldina. A declaração de Ramagem, portanto, é FALSA.
A despesa autorizada para a obra é de R$ 72,3 milhões, cerca de 47% menos do que o informado pelo pré-candidato.
O montante citado por ele, na verdade, inclui valores que a empreiteira deve receber pela construção do Museu Olímpico após a aprovação de aditivos contratuais. Inicialmente contratada por R$ 52,2 milhões, a obra pode custar ao final R$ 73 milhões aos cofres públicos.
Tarcísio Motta
“Tenho muito orgulho de defender o programa que tirou o Brasil da fome.”
A declaração de Motta é imprecisa, porque omite que, apesar de ter deixado o Mapa da Fome durante os governos petistas, o Brasil nunca deixou de registrar milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar grave — classificação dada a quem não tem o que comer.
Dados da série histórica do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), que começa em 2004, mostram que o menor índice de insegurança alimentar grave foi registrado em 2013, durante a primeira gestão de Dilma Rousseff (PT). Naquele ano, havia 7,2 milhões de pessoas nessa situação, o equivalente a 3,6% da população.
O Brasil deixou o Mapa da Fome da ONU (Organização das Nações Unidas) em 2014, durante a gestão Dilma, devido a uma queda nos índices de subalimentação e a uma mudança de metodologia. Isso, portanto, não permite dizer que a fome foi extinta no país, mas sim que foi alcançado um limiar inferior ao definido pela organização.
“Ramagem, inclusive, o candidato do Amorim, aquele em que ele vai votar, inclusive foi um dos autores deste PL do estupro.”
A declaração é VERDADEIRA. Ramagem, que atualmente ocupa a cadeira de deputado federal, é um dos 54 autores do projeto de lei 1.904/2024, que ficou conhecido como PL do Estupro por prever punições inclusive para vítimas de estupro que realizarem procedimentos de interrupção da gravidez após a 22ª semana de gestação.
Como equipara o aborto ao crime de homicídio, cuja pena varia de seis a 20 anos de prisão, o projeto permitiria que mulheres vítimas de estupro recebessem punições mais severas do que os próprios estupradores. As sentenças para esse crime variam de seis a 12 anos de prisão.
Rodrigo Amorim
“O prefeito atual do Rio de Janeiro tem um TAC assinado com o Ministério Público, com o antigo secretário de Ordem Pública dele, que impede qualquer ação referente ao crack.”
A alegação é FALSA, porque o TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) assinado em 2012 pela gestão de Eduardo Paes junto ao Ministério Público não impede que sejam adotadas medidas para combater o consumo de crack na cidade.
Na verdade, o termo regulamenta uma série de ações a serem adotadas pelo município para garantir o acolhimento da população em situação de rua, como a capacitação de profissionais da Guarda Municipal, a ampliação de estratégias de saúde e de programas de moradia e o cadastramento de usuários de drogas e de pessoas sem moradia.
Outro ponto importante do acordo prevê o fim da internação compulsória — ou seja, o dependente químico passa a ser livre para aceitar ou não o recolhimento a um abrigo para tratamento.
Outro lado. Procurada pelo Aos Fatos, a equipe de Amorim discordou da classificação e disse que o pré-candidato, além de ter dado uma declaração opinativa, considera que, ao ter assinado o TAC, Paes demonstra passividade em relação ao combate ao consumo de crack.
Marcelo Queiroz
“Você [Eduardo Paes] extinguiu a Secretaria de Administração que cuida do servidor público.”
A declaração é FALSA, porque a Secretaria de Administração existiu até 2016, último ano do segundo mandato de Paes. Conforme pode ser verificado no DOM (Diário Oficial do Município), ao fim daquele ano, o titular da pasta era o próprio Marcelo Queiroz.
A secretaria deixou de existir em 2017, na gestão do então prefeito Marcelo Crivella (Republicanos), que cortou pela metade o número de pastas municipais. Em janeiro do primeiro ano de mandato de Crivella, a secretaria já não constava na estrutura oficial de governo.
Ao reassumir a Prefeitura do Rio de Janeiro, Paes aumentou o número de secretarias para 30. E não recriou a Secretaria de Administração.
Outro lado. Aos Fatos procurou os cinco pré-candidatos por meio de suas assessorias na tarde desta sexta-feira (9) para que eles pudessem comentar as checagens, mas nenhum deles respondeu.
O caminho da checagem
Aos Fatos transcreveu o debate usando a ferramenta Escriba. As declarações dos pré-candidatos que citavam informações passíveis de verificação foram selecionadas e distribuídas para os repórteres na manhã desta sexta-feira (9).
A checagem das declarações foi feita por meio da consulta a documentos oficiais, como o Diário Oficial do Município e o Plano Orçamentário da prefeitura, além de posicionamentos publicados em portais da própria gestão municipal e reportagens da imprensa.
Por fim, também procuramos as assessorias dos pré-candidatos via email e abrimos espaço para que comentassem as checagens, caso considerassem necessário.
Esta reportagem foi atualizada às 15h do dia 12 de agosto de 2024 para incluir o posicionamento do pré-candidato Rodrigo Amorim.