A lista dos dez países que mais solicitaram remoções de conteúdo no X (ex-Twitter) não inclui o Brasil, acusado por Elon Musk, dono da plataforma, de ser o pior lugar do mundo quando o assunto é censura. Quarto maior mercado do X, o Brasil ocupa, num ranking de 96 países, a 11ª posição no ranking de pedidos de remoção. Enviou à plataforma, entre 2012 e 2021, 1.228 solicitações de exclusão de postagens ou bloqueio de contas — uma média de 123 solicitações por ano.
Esse resultado coloca o Brasil bem atrás de países como Japão, Turquia, Rússia, Índia e Coreia do Sul, os que mais fizeram requisições de retirada de conteúdo. Juntos, eles concentram mais de 92% de todos os pedidos enviados à plataforma no período (252.610 de 272.651). O ranking lista países que, nesses dez anos, de acordo com os dados, fizeram pedidos de remoção à empresa.
O topo do ranking se divide entre países democráticos – como Japão, Coreia do Sul, França e Estados Unidos – e outros com governos autoritários, como Turquia, Rússia, Índia, Paquistão e Emirados Árabes. A diferença está no tipo de remoção solicitada pelos países.
A Índia, por exemplo, tem determinado a exclusão de contas de opositores políticos e de conteúdos contrários ao governo, entre eles posts com links para o documentário “Índia: A questão Modi”, da BBC, que foi censurado da plataforma.
O caso ocorreu no início de 2023 – já sob a administração de Musk – mas não está contabilizado nos dados mais recentes sobre pedidos de remoção enviados à plataforma. Desde que o bilionário assumiu a empresa, os relatórios de transparência que apresentavam essas e outras informações deixaram de ser divulgados.
As informações disponíveis, referentes ao período de 2012 a 2021, mostram o número total de requisições feitas por autoridades governamentais à plataforma por país a cada semestre.
Esses pedidos podem incluir desde decisões judiciais — como as solicitações feitas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) e pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para bloqueio de perfis que disseminaram desinformação sobre o processo eleitoral — até requisições policiais ou outros tipos de solicitações oficiais que tenham fundamento legal – por exemplo, as denúncias de conteúdos extremistas enviadas pelo Ministério da Justiça no âmbito da Operação Escola Segura em 2023.
As solicitações também podem vir de processos civis ou criminais, como ações por difamação ou direito autoral em diferentes instâncias.
- Este ano, por exemplo, o youtuber Cellbit entrou com um processo contra 217 contas da plataforma por disseminar informações falsas contra ele. Os alvos da ação são os usuários, mas o X foi acionado para a remoção dos perfis.
- Em um caso parecido, um juiz da 2ª vara do Juizado Especial de São Paulo determinou que a plataforma excluísse postagens com ofensas à ex-BBB Laís Caldas em 2023.
Pedidos de informação. Além de remoções, autoridades também podem solicitar informações sobre contas em plataformas, para apoiar investigações ou processos judiciais. Mesmo nesses casos, o Brasil também não chega ao pódio dos países com mais solicitações, ficando em 10º lugar, com 1.646 solicitações no total. Esse número:
- Representa menos de 5% das solicitações feitas por autoridades dos Estados Unidos (40.658), país considerado democrático;
- Também coloca o país atrás de Japão (21.491), Índia (13.878), França (13.145), Reino Unido (8.518), Turquia (6.089) e Alemanha (4.934), em quantidade de pedidos por informação.
Descumprimento. Além de não serem tão numerosos, os pedidos legais enviados por autoridades brasileiras ao Twitter nem sempre foram atendidos. Na maioria dos casos, na verdade, não foram.
- Entre 2012 e 2021, a taxa média de compliance da empresa para solicitações de remoção de conteúdo de autoridades brasileiras foi de 39% — ou seja, mais de 60% dos pedidos para exclusão de posts ou bloqueio de contas não foram atendidos.
- Com relação a pedidos de informação, a taxa foi ainda menor: apenas 23% das solicitações foram atendidas.
Esse aparente descumprimento de solicitações “não é necessariamente má intenção da plataforma”, defende a pesquisadora Yasmin Curzi, do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV.
Ela explica que a plataforma pode deixar de atender aos pedidos por diferentes motivos, entre eles:
- falta de fundamentação legal adequada — quando o pedido está em desacordo com as legislação local;
- incapacidade técnica — quando, por exemplo, os dados solicitados não são coletados pela plataforma;
- Ou falta de corpo técnico para atender a demanda.
Para isso, a empresa pode recorrer das decisões judiciais e questionar juridicamente os pedidos. Casos assim foram expostos no Twitter Files, um conjunto de supostos emails de funcionários do Twitter no Brasil. Em um deles, o consultor jurídico da plataforma, Rafael Batista, informa que a empresa iria recusar pedido da CPI das Fake News que solicitava informações de registro de certas contas, usando como base jurisprudência anterior.
“Nem todos os pedidos precisam ser atendidos. Depende da validade legal e da conformidade com os padrões internos da empresa e com os direitos humanos fundamentais, como a privacidade e a liberdade de expressão”, afirma.