Uma reportagem do Radar Aos Fatos publicada na sexta-feira (22) mostrou que a confusão na divulgação dos dados da CoronaVac, vacina desenvolvida pelo Instituto Butantan em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac, serviu de combustível para a desconfiança no Twitter.
Os posts partiram principalmente de apoiadores de Jair Bolsonaro (sem partido), que viram na situação uma oportunidade para atacar também o governador paulista, João Doria (PSDB), hoje o principal antagonista do presidente.
Uma leitura atenta dos dados, no entanto, mostra que, a despeito desse episódio, bolsonaristas têm perdido espaço no debate sobre vacinas na rede. Nos dois outros momentos-chave do ano até agora —o primeiro anúncio de eficácia da CoronaVac, em 7 de janeiro, e o início da vacinação em São Paulo, no dia 1º—, perfis de apoiadores do presidente representaram apenas entre 6% e 7% das interações sobre o tema.
Esse dado é importante porque, além de ser raro que o grupo tenha uma representatividade tão baixa em um debate quente nas redes, é dele que vem a maior parte dos posts que reproduzem desinformação sobre as vacinas, como o Aos Fatos já demonstrou.
Embora não seja representativo da população geral, o Twitter é útil para entender as tendências no discurso de atores políticos e militantes motivados. Neste caso, o que parece ter acontecido é que o início da vacinação no Brasil e a crescente popularidade dos imunizantes diminuíram o apelo do discurso antivacina.
A própria postura do governo federal indica a inflexão: depois de meses repetindo informações falsas sobre as vacinas, especialmente sobre a da Sinovac, o presidente disse na semana passada que o medicamento produzido pelo Butantan é "do Brasil. Não é de nenhum governador não, é do Brasil”.
Sem as teorias da conspiração, bolsonaristas parecem ainda não ter encontrado um outro discurso político coeso para se contrapor a Doria, que desde o começo apostou nas vacinas e agora está colhendo resultados. Uma pesquisa do Datafolha divulgada no domingo (24) indicou que 46% dos brasileiros acreditam que o governador fez mais no combate à pandemia que Bolsonaro.
Se por um lado esses dados oferecem a perspectiva alentadora de que o negacionismo sobre vacinas possa estar em queda, o efeito da divulgação confusa feita pelo governo de São Paulo sugere que a tendência não é irreversível. E mostra que adversários da ciência — seja por crença, seja por motivos políticos — não perderão oportunidades de ataque.
Nos próximos meses, enquanto a população estiver sendo vacinada, outros desafios de comunicação vão aparecer. Por exemplo, uma parte de quem receber o imunizante provavelmente se infectará com o coronavírus, enquanto outros poderão apresentar reações adversas. A lição deste começo de ano é de que a transparência dos dados e a sobriedade —não o marketing político— deveriam guiar a comunicação oficial sobre esses assuntos daqui para frente.
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