Especialistas e representantes da sociedade civil criticaram nesta quarta-feira (22), em audiência pública promovida pela AGU (Advocacia-Geral da União), as mudanças anunciadas no início do mês pela Meta. No último dia 7, a plataforma comunicou o fim do programa de checagem de fatos nos Estados Unidos e a flexibilização de sua política de discurso de ódio, em aceno ao novo governo de Donald Trump.
A aplicação da nova política no Brasil foi confirmada pela Meta no último dia 13. A AGU considerou que a mudança fere a lei brasileira e organizou a audiência para discutir a resposta do governo.
Foram convocados para o debate 45 representantes de organizações jornalísticas e da sociedade civil e pesquisadores da academia, cujas colaborações serão levadas ao STF (Supremo Tribunal Federal). A corte discute atualmente a responsabilização das plataformas por conteúdo criminoso disseminado por terceiros. Convidadas, nenhuma das big techs compareceu ao evento.
Como Aos Fatos mostrou, a nova política de discurso de ódio da Meta permite conteúdos que desrespeitam a lei brasileira, como expressões de supremacia racial e de preconceito religioso. Frases como “os brancos são os melhores” e “eu odeio negros” estão entre as autorizadas a circular pelas novas regras do Instagram e do Facebook.
“A liberdade de expressão e a liberdade de pensamento são inegociáveis, mas não devem ser usadas como passe livre para assédio, violência e extremismo”, defendeu a diretora executiva do Aos Fatos, Tai Nalon, durante a audiência.
Em sua intervenção, Nalon rebateu os ataques do CEO da Meta, Mark Zuckerberg, aos checadores, lembrando que a própria empresa sempre elogiou a atividade. Ela ressaltou ainda que o Aos Fatos passa por auditoria anual da IFCN (International Fact-Checking Network) desde 2016 para avaliar o cumprimento de princípios como a transparência, o apartidarismo e a independência editorial.

“O que estamos assistindo é um retrocesso no enfrentamento da desinformação, do discurso de ódio e de conteúdos que possam representar riscos à vida”, afirmou Renata Mielli, coordenadora do CGI.br (Comitê Gestor da Internet no Brasil), citando como exemplo as mentiras relacionadas à saúde. Mielli também defendeu que as plataformas devem respeitar a soberania dos países e cooperar na defesa dos processos democráticos.
Tarcizio Silva, consultor da Abong (Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais), considerou que a moderação de conteúdo racista, misógino e homofóbico pelas plataformas já era falha, mas “agora os grandes nomes das empresas estão explicitamente autorizando e incentivando discurso nocivo”. Para o especialista, o Brasil está atrasado, em relação a outros países, na reação aos impactos negativos das plataformas.
Já Alana Manchineri, gerente de comunicação da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), ressaltou a importância do combate à desinformação nas redes, lembrando o impacto que uma notícia falsa sobre a segurança das vacinas teve no combate à Covid-19 nas comunidades indígenas. A ativista também acredita que, com a mudança na Meta, a tendência é de aumento da violência e ameaças contra os povos originários.
“A política que a Meta e todas as redes vêm desenvolvendo no Brasil já são políticas equivocadas do ponto de vista da intolerância”, avaliou Victor De Wolf, presidente da ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos).
“A gente já vê graves crimes de ódio acontecendo, várias violações, calúnias e golpes contra a nossa comunidade”, ressaltou De Wolf, lembrando que o movimento lançou um manifesto para impedir a empresa de implementar as mudanças anunciadas.
Pelas novas regras da Meta, passaram a ser autorizados conteúdos que relacionam questões de gênero e orientação sexual a doenças mentais, anomalias, pecados e imoralidades.
O caminho da apuração
Aos Fatos acompanhou a audiência pública da AGU, registrando a contribuição dos movimentos sociais sobre a mudança na política de discurso de ódio da Meta.