Atentado contra Trump aponta riscos de uma moderação enfraquecida nas ‘big techs’

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A bala que atingiu a orelha direita de Donald Trump, o ex-presidente que tenta voltar ao poder nos Estados Unidos, foi o gatilho para uma onda de desinformação que atingiu os brasileiros como um caixote no mar em dia de ressaca. De 2024 para 2018, de Butler, na Pensilvânia, para Juiz de Fora, em Minas Gerais, as comparações entre o tiro em Trump e a facada em Jair Bolsonaro foram inevitáveis.

A tormenta que acompanhou os dois episódios também foi semelhante. Figuras proeminentes do trumpismo acusaram o atirador de agir a mando da esquerda globalista antifascista — e usaram a foto de um jornalista esportivo italiano para "comprovar" sua tese. Já Bolsonaro e seus aliados mobilizaram até sua "Abin paralela" para investigar quem estaria por trás do ataque de Adélio (spoiler: ninguém).

Do outro lado do tabuleiro político, no mesmo dia do atentado contra Trump, o deputado federal André Janones (Avante-MG) disse que a "fakeada" fez escola e que "dessa vez lembraram de providenciar o 'sangue'", ecoando desinformações que circularam após o ataque contra Bolsonaro. Depois, uma publicação viral alegou que uma perícia teria comprovado que o sangue no republicano era de mentira — o que é falso.

Tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, a maré desinformativa avança num momento crítico para as plataformas. O jornalista Casey Newton, referência na cobertura sobre big techs, alertou que o atentado foi o primeiro grande evento que pegou os times de trust and safety (confiança e segurança, em tradução livre) muito reduzidos após demissões em massa nessas companhias.

Em geral, nessas equipes estão os moderadores, responsáveis por avaliar se milhares de publicações diárias violam, ou não, as regras das próprias plataformas. É um trabalho árduo, desgastante e cada vez mais precarizado, como mostra a série de reportagens que este Aos Fatos vem publicando desde a semana passada.

A repórter Gisele Lobato conversou com moderadores de todas as principais plataformas e construiu uma radiografia sombria do setor. A meses da eleição municipal no Brasil, a primeira com a popularização das ferramentas de inteligência artificial generativa, os moderadores estão pressionados por objetivos cada vez mais difíceis de serem alcançados e sofrem com a piora nas condições de trabalho.

A piora está relacionada a demissões que afetaram as equipes no Brasil, mas não é possível mensurar o impacto num ano eleitoral devido à falta de transparência das empresas. Sem regulação no país, elas não apresentam informações que estão disponíveis em relatórios entregues às autoridades da União Europeia.

Os próprios moderadores não sabem dizer quantos colegas trabalham no mesmo time, já que a atividade é quase sempre exercida remotamente. Como se a situação não fosse crítica o suficiente, os trabalhadores temem ainda serem substituídos por ferramentas de IA. “A gente sente que trabalha para alimentar um sistema de inteligência artificial e que um dia vai ser substituído por ele", contou um deles a Gisele Lobato.

A situação é, de fato, preocupante. O histórico das plataformas em situações de crise não é nada bom — Meta e TikTok, por exemplo, foram omissos diante da convocação para o 8 de Janeiro, segundo seus próprios moderadores. Até porque episódios como o atentado contra Trump mostram que cada canto do espectro político tem uma teoria da conspiração para chamar de sua nessas horas.

Com eleições em mais de 5.000 municípios brasileiros em menos de três meses, não nos resta outra opção que não nos mantermos vigilantes na defesa da integridade da informação. Afinal, a atuação das empresas neste cenário permanece uma incógnita.

Referências

  1. Aos Fatos (1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7)
  2. Folha de S.Paulo
  3. Platformer
  4. Wired

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