🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Maio de 2020. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Apoio à cloroquina engaja mais no Twitter sustentado em desinformação

Por Marina Gama Cubas, Bruno Fávero e Amanda Ribeiro

21 de maio de 2020, 17h11

Recorrendo a desinformação e impulsionadas por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, publicações que defendem o uso da cloroquina no tratamento da Covid-19 têm dominado o debate sobre a droga no Twitter, mostra levantamento do Radar Aos Fatos. De 8 a 20 de maio, tweets favoráveis ao medicamento representaram 65% dos conteúdos mais populares sobre o assunto na rede. Quase metade (47%) dessas publicações que exaltam o remédio reproduzia alguma informação falsa ou distorcida.

Mesmo sem comprovação científica de sua eficácia, a cloroquina tem sido defendida por Bolsonaro como tratamento para o novo coronavírus. Discordâncias sobre a droga motivaram as demissões de dois ministros da Saúde em menos de um mês, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, que não queriam autorizar a ampliação de sua utilização no SUS (Sistema Único de Saúde). Na quarta-feira (19), o ministro interino da pasta, general Eduardo Pazuello, publicou uma nova orientação que libera o uso da medicação em todos os pacientes com Covid-19.

Para a análise, o Radar Aos Fatos coletou 390 tweets – os trinta com mais interações (soma de curtidas e retweets) em cada dia –, que foram classificados com base em seu posicionamento em relação à cloroquina e se continham ou não desinformação. Das postagens analisadas, 253 (65%) citavam o medicamento de forma positiva e apenas 39 (10%) de forma negativa; 98 (25%) eram neutros ou apenas reproduziam notícias sobre o assunto.

O domínio dos tweets positivos também é expressivo quando o engajamento é usado como métrica. Em média, as postagem sobre cloroquina analisadas somaram 322 mil interações por dia, das quais 61% foram geradas por tweets favoráveis, 14% por negativos e 25% por neutros ou informativos.

O levantamento ainda mostrou que posts com informações falsas ou distorcidas foram minoria nesse universo, mas tiveram presença significativa: representam cerca de um terço (124 de 390) dos tweets analisados e da média de suas interações diárias (104 mil entre 322 mil).

Quase a totalidade (97%) dos posts com desinformação era de apoio à cloroquina. Um exemplo típico de conteúdo enganoso que aparece com frequência é semelhante ao do tweet do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) que diz que a droga está "salvando vidas". Na verdade, não há comprovação científica de que o remédio seja eficaz contra o novo coronavírus.

Perfis. O perfil @Leitadas_L0en foi o que mais publicou tweets sobre a cloroquina e também o que mais propagou informações falsas no período analisado. Das 28 postagens, 27 continham conteúdo favorável à substância e, em 13, havia desinformação. Nesta semana, o Twitter Brasil bloqueou o perfil por violar as regras da plataforma.

O responsável pelo perfil se autodescreve como “miliciano digital”. @Leitadas_L0en chegou a levantar a hashtag #NiseNaSaúde -- Trends Topics no dia 18, segundo a plataforma Trendy --, em referência à médica Nise Yamaguchi, defensora do uso da cloroquina no tratamento da Covid-19.

Em seguida, aparecem como mais influentes no debate uma sequência de outros quatro perfis bolsonaristas, incluindo membros da equipe de governo e da família do presidente Jair Bolsonaro, como seu filho Eduardo Bolsonaro e seu assessor especial, Arthur Weintraub. Assim como @Leitadas_L0en, todos eles publicaram apenas tweets a favor da cloroquina, em sua maioria, e com conteúdos desinformadores.

Cronologia. Além da análise quantitativa das menções à cloroquina, Radar Aos Fatos categorizou os 30 tweets mais populares de cada dia sob os seguintes critérios: 1) conteúdo favorável ao uso da cloroquina no tratamento da Covid-19; 2) conteúdo contrário ao uso do medicamento; 3) conteúdo informativo ou noticioso (nesse caso foram levados em conta o conteúdo do tweet e do link compartilhado, não a posição editorial dos veículos ou jornalistas); 4) conteúdo neutro; e 5) outros (quando a menção à cloroquina está presente mas não é o assunto principal do tweet).

Entre os dias 8 e 20 de maio, o tema alcançou vários picos de menção na rede. Os três principais estão relacionados com os movimentos políticos e ao noticiário brasileiro envolvendo o assunto. O primeiro deles foi no dia 11, dois dias após o Brasil ultrapassar a marca de 10 mil mortes por Covid-19, e um dia depois de um médico no Piauí afirmar que esvaziou a UTI de seu hospital receitando cloroquina. Aos Fatos mostrou que a notícia era distorcida.

Na ocasião, o debate chegou ao seu ápice a partir de uma ação coordenada de perfis bolsonaristas, que impulsionaram a hashtag #TeichLliberaACloroquina. A hashtag começou a crescer na rede às 6h do dia 11, chegando ao seu pico às 12h. Durante todo o dia, 60% das postagens sobre cloroquina incluíam a hashtag.

Ainda no dia 11, entre os 30 tweets com mais popularidade, 26 continham conteúdo favorável à cloroquina, 14 com informações falsas. Quanto ao engajamento, as postagens a favor do medicamento somavam 77% de todas as interações dos 30 tweets.

No dia 15, quando Nelson Teich pediu demissão, o debate ganhou ainda mais força. A imprensa atribuiu a saída do então ministro da Saúde do governo à pressão de Bolsonaro para expandir o protocolo de uso da cloroquina nos pacientes com Covid-19. Entre os 30 tweets mais populares daquele dia, 23 eram favoráveis à droga e representavam 64% das interações.

No entanto, o engajamento de postagens contrárias ao uso da droga também ganhou fôlego, chegando a 25% e alcançado 35% no dia seguinte, 16 - foram três tweets contrários no dia 15 e cinco no dia 16.

O terceiro maior pico se deu na última quarta-feira (20), quando o governo anunciou a mudança na orientação sobre o uso da cloroquina no tratamento para pacientes da Covid-19, incluindo enfermos que estão em um estágio mais leve da doença. Nesse momento, o número de tweets informativos e noticiosos (11) superou o de favoráveis à substância (10). O engajamento das postagens que apoiam o uso do medicamento, porém, continuou alto, com 46% das interações.

Referências

1. Aos Fatos 1, 2

Metodologia

Primeiramente, foram capturados, via API pública do Twitter, 1.706.240 tweets que continham os seguintes termos e foram publicados entre os dias 8 e 20 de maio:

hidroxicloroquina ou cloroquina ou malária ou malaria ou lupus ou lúpus ou artrite ou hidrocloroquina ou hidroxibolsoquina ou "kit covid" ou #teichliberacloroquina ou #tratamentoprecoce ou #hidrocloroquina ou #cloroquina v #hidroxicloroquina ou #hidroxicloroquinajá ou #hidroxicloroquinaja ou #cloroquinajá ou #cloroquinaja ou #LiberemAHidroxicloroquina ou #cloroquinanoambulatório ou #cloroquinanoambulatorio ou #kitcovidjá ou #kitcovidja ou #kitcovid ou #liberaahidroxicloroquina ou #liberacloroquina ou #cloroquinacura ou#cloroquinapelavida ou #cloroquinasalvavidas ou #cloroquinanosus ou #bolsoquina ou #CloroquinaMata ou #CloroquinaDerrubouMaisUm ou #teichproibecloroquina ou #HidroxicloroquinaCura ou #Hidroxicloroquinamataao

Foram selecionados os 30 tweets mais popularidade de cada dia e analisados manualmente sob o seguinte critério:

sob os seguintes critérios: 1) conteúdo favorável ao uso da cloroquina no tratamento da Covid-19; 2) conteúdo contrário ao uso do medicamento; 3) conteúdo informativo ou noticioso (nesse caso foram levados em conta o conteúdo do tweet e do link compartilhado, não a posição editorial dos veículos ou jornalistas); 4) conteúdo neutro; e 5) outros (quando a menção à cloroquina está presente mas não é o assunto principal do tweet). Por fim, foi feita a análise se o conteúdo (mensagem publicada e link publicizado) continha ou não desinformação.

Todos os tweets categorizados podem ser encontrados aqui.

Colaboraram João Barbosa e Bárbara Libório

Esta reportagem foi atualizada às 19h13 de 22 de maio de 2020 para incluir link para todos os tweets categorizados.

sobre o

Radar Aos Fatos faz o monitoramento do ecossistema de desinformação brasileiro e, aliado à ciência de dados e à metodologia de checagem do Aos Fatos, traz diagnósticos precisos sobre campanhas coordenadas e conteúdos enganosos nas redes.

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