Enquanto órgãos técnicos seguem investigando as causas do apagão que atingiu todos os estados brasileiros exceto Roraima, políticos, influenciadores e usuários que apoiam o governo Lula (PT) têm usado as redes para espalhar rumores sem comprovação sobre uma suposta relação entre o incidente e a privatização da Eletrobras, concretizada no governo Jair Bolsonaro (PL).
Até a tarde desta quarta (16), posts que traçam essa relação acumulavam milhões de visualizações na rede X (ex-Twitter) e dezenas de milhares de compartilhamentos no Facebook.
- Logo na manhã de terça (15), horas após o início do apagão, o ex-presidenciável Ciro Gomes (PDT) publicou na rede X que a venda da Eletrobras ao capital privado foi uma das “maiores irresponsabilidades que já se praticou no Brasil”;
- Gomes ainda culpou Lula por não ter revertido a privatização e disse, sem mencionar textualmente o blecaute, que era necessário investigar se houve sabotagem;
- Horas depois, a primeira-dama, Rosângela da Silva, postou a mensagem: “A Eletrobras foi privatizada em 2022. Era só esse o tuite”;
- Enquanto alguns usuários entenderam que Janja respondia ao post de Ciro — que nunca afirmou que a Eletrobras havia sido privatizada pelo atual governo —, outros interpretaram a mensagem como uma tentativa de gerar uma relação de causalidade entre a privatização e o blecaute;
- Outros governistas que compartilharam críticas à privatização logo após o blecaute foram o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), e a deputada Gleisi Hoffmann (PT-RS).

Ambiguidade. Mesmo sem estabelecer relação direta, post da primeira-dama foi interpretado como uma sugestão de causalidade entre medida do governo Bolsonaro e o apagão (Reprodução/X)
O post da primeira-dama foi citado em diversas publicações de usuários anônimos no Facebook, no X e no TikTok que também buscavam culpar a privatização da Eletrobras pelo blecaute. Em linhas gerais, as publicações responsabilizavam o ex-presidente Bolsonaro pelo caso e alegavam que a esquerda já havia avisado que a privatização traria problemas. Como suposta prova para a teoria, os usuários citaram o pedido de demissão do ex-CEO da Eletrobras, Wilson Ferreira, que deixou a empresa um dia antes do caso.

Exemplos. Publicação de Janja foi citada em outras que relacionaram o apagão à privatização da Eletrobras (Reprodução/TikTok)
Até o momento, não há informações sobre as causas do blecaute nas linhas de transmissão do SIN (Sistema de Integração Nacional), que se iniciou às 8h31 de terça-feira (15) e perdurou em alguns estados até o meio da tarde.
Técnicos ouvidos pela imprensa citam diversas possibilidades, incluindo falhas técnicas e sobrecargas. Questionado pelo UOL, o ex-técnico do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), Ary D’ajuz, disse achar pouco provável que a privatização da Eletrobras tenha alguma relação com o caso: “As empresas são proprietárias daquelas instalações, mas seguem os rituais que o ONS manda executar”, explicou.
Versão da direita. O post de Janja também repercutiu entre usuários de direita: enquanto alguns atacaram a primeira-dama por fomentar desinformação, outros compartilharam trechos da edição da última terça (15) do programa Estúdio i, da GloboNews, que debatiam a publicação.
Políticos e usuários de direita também se aproveitaram da falta de informações para disseminar acusações sem provas nas redes:
- O senador Ciro Nogueira (PP-PI), ex-ministro de Bolsonaro, atribuiu a culpa do incidente ao governo Lula e relacionou o caso ao aumento do preço dos combustíveis, anunciado pela Petrobras no mesmo dia;
- Outras publicações anônimas identificadas pelo Radar Aos Fatos sugeriam que o apagão teria sido proposital para justificar a compra de energia da Venezuela, decretada por Lula no início do mês;
- Essa última teoria, no entanto, sequer faz sentido, porque o decreto que visa à importação de energia deve beneficiar apenas Roraima, único estado que não sofreu com o apagão por não estar interligado ao SIN.

Venezuela. Versão defendida por parte da direita tenta relacionar apagão à importação de energia da Venezuela decretada por Lula (Reprodução/X)




