O presidente Michel Temer fez uma participação no programa do apresentador Silvio Santos no último domingo (28). Numa ofensiva pela aprovação da reforma da Previdência na volta dos trabalhos do Congresso, Temer usou grande parte do tempo na TV para defender a proposta.
Aos Fatos checou algumas de suas afirmações durante o programa e verificou que Temer defendeu o principal projeto de sua gestão com dados incorretos a respeito de tempo de contribuição, rombo nas contas e cálculo do benefício. Veja abaixo o resultado.
Este projeto de Previdência não alcança os mais pobres, aqueles que ganham um, dois, três salários mínimos.
A afirmação do presidente é apenas verdadeira para trabalhadores que recebem até um salário mínimo, conforme o texto atual da reforma da Previdência. A Constituição prevê, em seu Artigo 201, que o benefício mínimo a ser oferecido ao aposentado é obrigatoriamente de um salário mínimo. "Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo", diz o parágrafo 2º.
Porém, trabalhadores que ganham dois ou três salários mínimos serão impactados pela mudança na forma do cálculo da aposentadoria e no recebimento de pensão por morte. Isso porque, de acordo com a proposta mais recente de reforma do governo, a aposentadoria passa a ser calculada com base em 100% dos salários recebidos. Na regra atual, são usados para o cálculo apenas 80% dos salários, excluindo os 20% menores.
As mudanças na pensão por morte também afetam pessoas com mais de um salário mínimo. Pela proposta do governo, a pensão deixa de ser integral, passando a 50% do valor do benefício do segurado falecido mais 10% por dependente (incluindo a viúva ou viúvo). Além disso, há um limite de dois salários mínimos para quem acumular os benefícios de pensão por morte e aposentadoria.
Pega o caso do sujeito, Silvio, que só se aposenta aos 65 anos porque ele começa a contribuir. De repente, ele para a contribuição e daí ele não consegue fazer os 35 anos de contribuição. Então ele se aposenta aos 65 anos. Nós diminuímos isso para 15 anos. Ou seja, quem hoje ganha até um salário mínimo, por exemplo, ele pode se aposentar com 55, 56, 57 anos.
A declaração do presidente é confusa e errada. Na proposta inicial de reforma previdenciária, apresentada em dezembro de 2016, o governo Temer aumentava de 15 para 25 anos o tempo mínimo de contribuição. No novo texto, apresentado em novembro de 2017, o governo voltou a colocar o tempo mínimo de contribuição em 15 anos.
Tanto no texto original, quanto na nova versão, o objetivo da reforma é gradualmente acabar com a aposentadoria por tempo de contribuição. Isso significa que quem só contribuiu durante 15 anos não poderá se aposentar antes de 65 anos de idade, no caso dos homens, e 62, no caso das mulheres.
Mesmo levando em conta as regras de transição, para conseguir aposentar com menos de 65 anos é necessário ter contribuído para a Previdência por, no mínimo, 35 anos. Ou seja, não será possível ter 15 anos de contribuição e se aposentar com "55, 56, 57 anos".
Hoje, Silvio, a dívida previdenciária é de R$ 189 bilhões. No ano que vem, R$ 220 bilhões.
A Previdência Social registrou um deficit nominal de R$ 182,4 bilhões, em 2017, segundo o último relatório divulgado pelo Ministério da Fazenda, em 22 de janeiro. Esse é o dado mais recente publicado pelo governo federal — e é R$ 6 bilhões abaixo do número citado por Temer.
Em relação ao rombo previdenciário estimado para 2018, consta do Orçamento Geral da União previsão de deficit de R$ 192,842 bilhões apenas para os segurados da iniciativa privada, por meio do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Na semana passada, o secretário de Previdência, Marcelo Caetano, afirmou que essa estimativa pode ser revista.
Questionada a respeito da fonte dos números citados por Temer na TV, a assessoria da Presidência ainda não havia respondido às perguntas da reportagem.
A dívida previdenciária é tão grande, tão expressiva que lá [na Grécia e em Portugal] foi preciso cortar 30%, 40% dos vencimentos dos funcionários públicos.
Portugal e Grécia enfrentaram uma forte crise econômica e descontrole nas contas públicas no fim da década passada. A partir de 2010, ambos os países iniciaram negociações a União Europeia e do FMI (Fundo Monetário Internacional). Em troca de suporte financeiro, os dois países aceitaram implementar medidas de austeridade que incluíam cortes nos salários de funcionários públicos.
O governo português se comprometeu a reduzir, em média, 5% os salários — medida que só foi suavizada em 2015 e abolida em 2016. No acumulado dos últimos seis anos, os cortes ficam em torno de 30%.
A Grécia se comprometeu nos acordos com a Troika, equipe composta pelo FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia, a cortar bônus e salários dos funcionários públicos e pensionistas, além de reduzir o salário mínimo nacional. Entre 2010 e 2012, esses cortes chegaram a 30%.