Dezenas de páginas falsas no Facebook se passam por perfis do governo federal e pagam anúncios na plataforma da Meta para turbinar o alcance de golpes financeiros. Na última semana, o Aos Fatos monitorou 30 páginas que, juntas, impulsionaram ao menos 850 anúncios mentirosos, alcançando quase 2 milhões de usuários.
Os posts fraudulentos fazem promessas de recuperação de dinheiro esquecido em bancos, resgate de indenizações e até mesmo informações sobre entregas não realizadas pelos Correios. Os golpistas usam ainda inteligência artificial para manipular vídeos de figuras públicas, como o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG).
Em meio a suspensão de programas de verificação e mudanças nas políticas de moderação da Meta, os golpes virtuais nas plataformas da empresa se multiplicam dia a dia. No ano passado, a empresa anunciou testes para combater fraudes digitais aplicadas com uso de imagem de celebridades e pessoas públicas. Contudo, casos como o do deputado federal mostram que o efeito é limitado.
Recentemente, Aos Fatos desmascarou um golpe que fornecia um falso cadastro no programa do governo federal Voa Brasil, que oferece passagens aéreas baratas. Esse golpe foi impulsionado por uma página chamada Direito Cidadania, que usa a logo oficial do CanalGov, veículo de notícias vinculado à EBC (Empresa Brasileira de Comunicação).

Na ocasião, a biblioteca de anúncios da Meta informava que havia centenas de anúncios impulsionados pela conta, todos com o objetivo de aplicar golpes. Além disso, o conteúdo fraudulento simulava páginas de outros veículos de comunicação, como o site de notícias g1, e imitava as páginas de acesso do programa Voa Brasil e do portal gov.br, exigindo o pagamento de uma taxa via Pix para concluir a falsa adesão ao benefício.
Em dezembro, Aos Fatos também revelou que a Meta permitiu que ficasse no ar uma série de páginas com golpes financeiros que usavam falsos bolões da Mega da Virada para cometer crimes. Mais de 200 anúncios promoviam um mesmo site fraudulento que simulava o layout da Caixa Econômica Federal.
Os cerca de 850 anúncios presentes nas páginas monitoradas pelo Aos Fatos patrocinavam fraudes que usavam iscas sobre o Voa Brasil, valores a receber, entregas retidas pelos Correios e indenização por vazamento de dados — todos casos que já foram desmentidos. Os perfis usam títulos com palavras que podem confundir os usuários quando associados a peças publicitárias e logotipos oficiais do governo federal.
Os termos mais comuns são:
- Governo federal
- Gov
- Auxílio
- Indeniza Brasil
- Indeniza cidadão
- Entregas
- Entregas rápidas
- Apoio brasileiro
- Apoio do brasileiro
- Programa social
- Resgate de valores
- Consulte gv
- Brasil honesto
Somente usando o termo “Gov”, a reportagem identificou pelo menos oito perfis, enquanto outros cinco usavam “governo federal” (veja aqui). Todos mantêm como foto de perfil ou de capa da página imagens que remetem ao Executivo federal ou suas autarquias (veja abaixo).

Não foi possível, no entanto, determinar o alcance de todos os anúncios, já que a Meta não disponibiliza esse tipo de informação para todos os conteúdos impulsionados. Ainda assim, o monitoramento da reportagem identificou que parte dos anúncios alcançou quase 2 milhões de pessoas no Facebook entre os dias 20 e 23 de janeiro.
Manipulado por IA. O deputado federal Nikolas Ferreira, um dos parlamentares de oposição ao governo Lula com maior presença nas redes, é o protagonista de centenas de golpes que prometem ajudar a recuperar dinheiro ou indenizações supostamente retidas pela gestão petista. Os golpistas usam vídeos verdadeiros do parlamentar e manipulam com IA tanto o áudio quanto os movimentos labiais (veja abaixo).

Falsos perfis de advogados. Aos Fatos também identificou que diversos anúncios usam vídeos manipulados por IA de advogadas, em que elas tiram dúvidas de usuários nas redes sociais sobre os golpes e garantem que não se tratam de fraudes. Os registros usam um texto padrão de resposta e induzem as pessoas a clicar no link fraudulento.

Outro lado. Aos Fatos procurou a Meta e questionou sobre a atuação da big tech no combate às fraudes digitais no Facebook. A Meta respondeu, em nota, que “atividades que tenham como objetivo enganar, fraudar ou explorar terceiros não são permitidas em nossas plataformas e estamos sempre aprimorando a nossa tecnologia para combater atividades suspeitas”. Das 30 páginas analisadas, 26 continuam no ar.
O governo federal também foi questionado sobre o combate aos golpes promovidos por falsas páginas governamentais. Em nota, a Secom explicou que tem “atuado constantemente sobre os perfis fraudulentos identificados com estas características e encaminhado, conforme a especificidade de cada caso, para atuação judicial via Advocacia-Geral da União ou para Polícia Federal”.
O caminho da apuração
Aos Fatos monitorou entre os dias 20 e 23 de janeiro 30 páginas que fingem ser órgãos governamentais no Facebook e que promoveram anúncios com golpes digitais. A reportagem acessou a biblioteca de anúncios da Meta e constatou que os perfis fraudulentos promoveram cerca de 850 anúncios que alcançaram quase 2 milhões de usuários.
Aos Fatos procurou a Meta para comentar sobre o que tem sido adotado para inibir esse tipo de crime. Em nota, a big tech respondeu que esse tipo de conteúdo não é permitido na plataforma e que busca aprimorar o combate a atividades suspeitas. O governo federal também foi procurado e afirmou, em nota, que casos de perfis fraudulentos que se passam pelo governo têm sido encaminhados à Advocacia-Geral da União ou à Polícia Federal.