Sim, regiões da Antártida ganharam gelo, mas isso não desmente a existência das mudanças climáticas

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Trabalhar com checagem de desinformação é aprender algo novo — e não necessariamente útil — todos os dias. Nesta semana, aprendi que quem acredita que as mudanças climáticas são reais é apelidado de “aceitacionista”, porque “aceita tudo o que os outros dizem sem questionar e pesquisar”.

Pois bem. Foi noticiado que a Science China Earth Sciences publicou um estudo que diz que a Antártida registrou um ganho de massa de gelo entre 2021 e 2023, contrariando a tendência de degelo das últimas décadas. Isso, segundo algumas publicações, seria uma prova de que as mudanças climáticas não passam de uma das várias teorias “aceitacionistas”.

Imagem gerada por IA mostra homem branco vestindo casaco, gorro e luvas em cima de uma geleira na Antártida. Sua expressão é de espanto. Abaixo, há uma legenda que diz: ‘aceitacionistas climáticos’
Publicações alegam que estudo chinês derrubaria a tese do aquecimento global (Reprodução/Telegram)

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Mas não é bem assim. Na verdade, não é nada assim.

O pequeno esforço que envolve ler o artigo publicado já mostra que o estudo não desmente o aquecimento global. O artigo de fato menciona que houve ganho de massa de gelo entre 2021 e 2023, impulsionado por uma “precipitação anômala”, mas que, no período estudado (2000-2023), o resultado final foi de perda de massa.

Na conclusão do próprio estudo, inclusive, os autores destacam que a comunidade científica deve prestar mais atenção à costa glacial da Antártida Leste para “enfrentar as mudanças climáticas”.

Jefferson Simões, professor de glaciologia da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) que participou de 29 expedições científicas às regiões polares — um “aceitacionista” que pesquisa, portanto —, também explicou que quem interpreta o estudo como uma maneira de negar as mudanças climáticas está tendo uma visão simplista da natureza.

“O manto de gelo tem 13,6 milhões de km² [o Brasil, por exemplo, possui 8,5 milhões de km²] e diferentes áreas respondem de maneiras diferentes. Você não espera que Manaus e Porto Alegre tenham o mesmo clima e a mesma resposta às mudanças do clima, por exemplo” — Jefferson Simões, em entrevista ao Aos Fatos.

Simões aponta que:

  • O estudo foi feito em apenas quatro bacias de drenagem do gelo antártico localizadas na parte oriental, que é mais fria;
  • O degelo é maior na Península Antártica e na Antártida Ocidental, partes mais quentes;
  • Hoje, o maior volume de degelo vem da Groenlândia, e não da Antártida.

Mapa mostra Antártida separada em 27 áreas e em três grandes grupos divididos por cores: um rosa, um verde e um amarelo. Uma linha verde serrilhada engloba partes das áreas 12, 13 e 17, que estão no grupo amarelo.
Estudo chinês foi feito entre áreas 12 e 13 das 27 que formam a Antártida (Reprodução)

Análise feita pela Nasa, agência espacial americana, mostra que, entre 2002 e 2023, toda a Antártida perdeu uma massa de 150 gigatoneladas de gelo por ano. E, para o espanto de quem não é “aceitacionista”, o nível do mar não parou de subir desde 1880.

Gráfico mostra uma linha que, apesar de registrar pequenas depressões, tem tendência de elevação. O texto está em inglês e mostra dados sobre o nível do mar entre 1880 e 2023.
Média do nível do mar global tem subido desde 1880 (Reprodução)

Agora falando sério aqui: o planeta está ficando mais quente e isso faz com que desastres como queimadas, secas e tempestades sejam cada vez mais comuns. As mudanças climáticas existem, e é consenso entre cientistas que a humanidade é responsável por elas.

Aceitem.

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