Com fala sem provas de Tarcísio, acusações de Nunes e Boulos sobre o PCC dominam redes no 2º turno

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Após um segundo turno com acusações mútuas de ligação com o PCC entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) alegou, sem apresentar provas, que a facção criminosa recomendou voto em Guilherme Boulos (PSOL), adversário do prefeito e aliado Ricardo Nunes (MDB), que estava ao lado dele durante a entrevista coletiva.

A declaração do governador — dada pouco antes das 12h, com as urnas ainda abertas e a votação em curso — teria como base relatórios da SAP (Secretaria de Administração Penitenciária).

A informação veio a público na noite de sábado (26), em texto do site Metrópoles, segundo o qual a pasta teria interceptado ao menos quatro bilhetes de membros da facção orientando voto na chapa do PSOL.

Neste domingo (27), o governador afirmou que o estado teria feito um “trabalho grande de inteligência” e “trocado informações” com a Justiça Eleitoral. O TRE-SP (Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, porém, negou ter recebido qualquer documento.

O secretário nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, Mário Luiz Sarrubo, afirmou, segundo a Folha de S.Paulo, que os serviços de inteligência do governo federal não receberam qualquer informe sobre a suposta ordem do PCC orientando voto no candidato do PSOL.

Boulos reagiu afirmando que a declaração do governador era “uma vergonha” e a classificou como o equivalente ao “laudo falso” do segundo turno, em referência à mentira espalhada pelo candidato derrotado Pablo Marçal (PRTB) na véspera do primeiro turno.

A campanha do PSOL ajuizou investigação eleitoral por abuso de poder político no TRE-SP contra Tarcísio e Nunes e vai protocolar uma notícia-crime no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

‘Cunhado do Marcola’

Desde o início da campanha, Boulos usa três casos para buscar ligar Nunes ao PCC. O principal deles é a nomeação de Eduardo Olivatto — irmão de Ana Maria Olivatto, morta em 2002, que de fato foi casada com o líder do PCC — ao cargo de chefe de gabinete de obras.

“Indicou Marcola do PCC, o cunhado do Marcola do PCC”, afirmou o candidato do PSOL na última sexta (25), no debate da Globo. “PCC dentro do ônibus no seu governo. PCC criando milícia na GCM no seu governo. Ricardo, isso é grave”, continuou, citando os outros dois casos a que faz referência para acusar o adversário.

Na quarta-feira (23), em entrevista ao Inteligência Ltda., Boulos disse que Nunes “botou o cunhado do Marcola, do PCC, como chefe de gabinete da Secretaria de Obras”.

“Um cara chamado Eduardo Olivatto. Aí ele [Nunes] respondeu dizendo: ‘Ah, Boulos, mas o cara já era de carreira’. Beleza, o cara era de carreira já há muitos anos. Só que ele nunca tinha ocupado um cargo de confiança.”

Conforme consta no site da prefeitura, Olivatto é servidor de carreira desde 1988. Antes de ser chefe de gabinete da Siurb (Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras), ele ocupou outros cargos de confiança em gestões anteriores — ao contrário do que diz Boulos —, como superintendente da SPUA (Superintendência das Usinas de Asfalto) e das superintendências de obras das subprefeituras de Parelheiros e Santo Amaro.

Nas redes

Já desde sexta (25) à noite, apoiadores de ambos os candidatos passaram a travar uma batalha para tentar associar os adversários ao crime organizado.

Ao menos 18 posts no Instagram e no Facebook, com 120 mil visualizações, já exploravam a notícia quando o próprio governador tratou de dar fôlego à corrente, na manhã deste domingo (27).

As falas de Tarcísio foram exploradas em “cortes” que atacam Boulos. O vídeo mais compartilhado foi publicado originalmente pelo deputado estadual Bruno Zambelli (PL) e repostado em outros perfis no Instagram.

Postagem mostra foto de Tarcísio discursando ao lado de Ricardo Nunes, dois homens brancos que vestem camisas sociais, com título ‘Urgente: PCC orientou voto em Boulos, diz Tarcísio’.
Publicações disseminam cortes em que governador de São Paulo alega, sem provas, que PCC orientou voto em Boulos (Reprodução/Instagram)

Até a intervenção de Tarcísio, porém, a maioria das publicações que associavam candidatos de São Paulo ao PCC tinham como alvo Nunes, não Boulos.

No final da manhã deste domingo (27), levantamento do Aos Fatos havia identificado menções a uma suposta ligação do atual prefeito com a facção em pelo menos 23 posts no Instagram e 13 no Facebook, que somavam 93 mil visualizações.

A suposta associação entre Nunes e o PCC voltou a ser mencionada por Boulos ao rebater os ataques de Tarcísio. “É o candidato que ele apoia que botou o PCC na Prefeitura de São Paulo”, disse.

O discurso ainda se refletia nas redes nesta manhã de segundo turno. Neste final de semana, vários perfis de apoiadores de Boulos compartilhavam a notícia de que Olivatto — a quem ele se refere como “cunhado do Marcola” — se tornou alvo de investigação do MP para voltar a associar o servidor a Nunes.

“O atual prefeito de SP tem em seu entorno de aliados simplesmente o ex-cunhado do Marcola”, publicou a deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP).

Em post, Thiago dos Reis escreveu: ‘Aqui estão Nunes, Tarcísio, e o ex-cunhado do Marcola, chefão do PCC. Contra fatos não há artgumentos’. Abaixo há uma foto dos três com os logos dos partidos MDB e Republicanos, além de símbolo com referência ao PCC 
Perfis que apoiam Boulos rebateram acusação de apoio do PCC associando facção a Nunes e Tarcísio (Reprodução/X)

Publicações também estão disseminando associações do atual prefeito com a notícia de que as empresas de ônibus UPBus e Transwolff, que atuam na capital paulista, são investigadas pelo Ministério Público por suspeitas de ligação com o PCC.

No debate realizado pela TV Cultura em 15 de setembro, Boulos chegou a afirmar que “Ricardo Nunes botou empresas ligadas ao tráfico de drogas no transporte” — apesar de os contratos com as companhias terem sido firmados em 2015, na gestão de Fernando Haddad (PT).

Além de repetirem argumentos construídos pela campanha de Boulos, publicações nas redes neste final de semana também compartilharam vídeo que apresenta como nova uma notícia de abril, publicada pela Folha de S.Paulo, que diz que a mulher de Nunes, Regina Carnovale, teria dito em uma briga de vizinhos há dez anos que era “casada com bandido” e ameaçado “chamar o PCC”, o que ela negou.

E o Lula?

O roteiro é similar ao ocorrido nas eleições de 2022, quando o ecossistema de desinformação em torno da candidatura de Jair Bolsonaro (PL) também procurou, às vésperas da votação, associar Lula (PT) ao crime organizado.

Como o Aos Fatos mostrou, naquele ano, o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, determinou na véspera do primeiro turno a derrubada de conteúdos que divulgavam uma suposta declaração de voto em Lula do principal líder do PCC, Marcos Willians Herba Camacho, conhecido como Marcola, que está preso.

Neste ano, as tentativas de associar candidatos à facção surgem em um contexto em que investigações mostraram que o PCC estava atuando para se infiltrar nas eleições municipais.

As operações não revelaram, porém, nenhuma relação entre candidatos a prefeito de São Paulo e o crime organizado. Os suspeitos de ligação com o PCC que foram eleitos estão sendo monitorados pelo TRE-SP e podem se tornar alvo de ação do Ministério Público.

O caminho da apuração

Aos Fatos coletou e contabilizou, no final da manhã deste domingo (27), posts no Facebook e no Instagram que mencionavam o termo “PCC”. O levantamento foi complementado com a análise das declarações de Tarcísio e da resposta de Boulos nas redes.

A reportagem também consultou notícias antigas e decisões do TRE-SP para mostrar como os discursos que associam os candidatos à facção foram explorados ao longo da campanha.

Referências

  1. Metrópoles
  2. g1 (1, 2 e 3)
  3. Folha de S.Paulo (1 e 2)
  4. Aos Fatos (1, 2, 3, 4 e 5)
  5. Uol
  6. Fórum
  7. O Estado de S. Paulo (1 e 2)

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