🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Maio de 2020. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Como a desinformação sobre caixões vazios impulsionou desmentidos em massa contra Carla Zambelli no Twitter

Por Marina Gama Cubas e Bárbara Libório

7 de maio de 2020, 15h30

Informações falsas de que caixões vazios são enterrados para inflar as estatísticas de morte por Covid-19 nos estados ganharam tração nas redes sociais em 29 de abril, após a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) afirmar em entrevista à Rádio Bandeirantes que isso estaria ocorrendo no Ceará, mostra levantamento do Radar Aos Fatos. A desinformação circulou de diferentes maneiras nas principais plataformas e, no Twitter, gerou sobretudo críticas à congressista, apoiadora do presidente Jair Bolsonaro.

Análise do Radar Aos Fatos a partir de 84.245 tweets publicados entre os dias 27 de abril e 4 de maio com termos relacionados à narrativa falsa dos caixões vazios mostrou que o tema ganhou tração em 29 e 30 de abril, após a fala da deputada, e em contornos políticos: dos 50 posts mais populares (com mais curtidas e compartilhamentos) nesses dois dias, 28 mencionaram Zambelli.

No Facebook, a desinformação se espraiou sem citações à deputada bolsonarista ou outros políticos. Checada por Aos Fatos, por exemplo, a foto de um caixão vazio tirada em 2007 em São Paulo foi difundida como se fosse no Amazonas no contexto da pandemia por pelo menos 52 posts na rede social, que acumularam cerca de 464 mil compartilhamentos entre 29 de abril e 6 de maio.

Buscas no Google por termos vinculados à desinformação tiveram pico no dia 29, após a fala de Zambelli, mas também cresceram em 3 de maio, pouco antes de o Fantástico, da TV Globo, reproduzir o trecho da entrevista da deputada e desmentir o que foi dito por ela.

O início da desinformação. Desde o início da pandemia, uma série de notícias falsas e distorcidas tem sido espalhada nas redes sociais para subsidiar o discurso bolsonarista de que os riscos da Covid-19 são superestimados. A narrativa dos caixões enterrados vazios é uma delas e busca, ainda, atacar governadores e desacreditar os dados estaduais que apontam alta crescente das mortes pela doença no país.

Para observar o comportamento da desinformação no Twitter, o Radar Aos Fatos classificou os 50 tweets mais populares sobre ela em quatro momentos (27 e 28 de abril; 29 de abril e 30 de maio; 1º e 2 de maio; e 3 e 4 de maio) entre aqueles que: traziam a informação falsa, a desmentiam ou a ironizavam e outros, como postagens que continham os termos buscados mas sem referência, reprodução ou desmentido sobre o assunto. Os dados foram capturados no dia 5 de maio.

Entre 27 e 28 de abril, 23 dos 50 posts mais populares traziam desinformação, como a de que caixões vazios ou com pedras foram enterrados para criar pânico, ampliar o número de mortos pela Covid-19 ou mesmo camuflar supernotificações de estados e municípios.

Neste intervalo, porém, o número de interações das 50 postagens mais populares é pequeno em relação aos dias que se seguiram: 3.413 curtidas e retweets contra 329.794 observadas nos dois dias seguintes (96,6 vezes mais).

A propagação. Entre os dias 29 e 30, a desinformação sobre caixões vazios deu lugar a críticas a Carla Zambelli por propagá-la. O conteúdo enganoso foi identificado em apenas 4 das 50 postagens mais populares. O restante eram comentários irônicos, ataques à postura da congressista e desmentidos sobre os enterros maquiados.

Mais da metade dos tweets (28) mencionou diretamente Carla Zambelli e a maioria (21) desmentiu as afirmações dela, pediu punição e apontou possíveis consequências do ato, como notícias de familiares que abriram caixões no Amazonas para verificar se os corpos estavam dentro.

Figuras públicas e políticos também passaram a participar do debate no Twitter a partir do dia 29. Parlamentares de esquerda, como o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) e Manuela D’Ávila (PC do B-RS), foram vozes que criticaram a deputada do PSL.

Menções a Zambelli continuaram a repercutir nos dias seguintes, 1º e 2 de maio. Das 50 postagens com mais interações, 20 citaram a deputada - apenas duas em apoio a ela. Nos dias 3 e 4, apenas oito mencionaram a parlamentar - cinco criticando e três informando que o Fantástico havia desmentido as afirmações dela à Rádio Bandeirantes.

Os tweets que mencionavam Zambelli foram classificados entre aqueles que criticavam sua fala, que reproduziam a desinformação disseminada por ela, e outros tipos de postagem, que em sua maioria informava sobre a entrevista dada por ela.

Já o número de conteúdos falsos variou de oito (dias 1º e 2 de maio) a cinco (3 e 4 de maio) entre os 50 tweets com mais interação em cada período. Chamou a atenção nesses dias postagens que desmentiam um vídeo em que uma mulher diz que caixões estavam sendo enterrados com pedras em Minas Gerais.

Nesse período, também se destacaram entre os tweets com desinformação reproduções de uma foto tirada no Amazonas em que uma pessoa parece carregar a alça de um caixão com apenas dois dedos, sugerindo que ele estaria vazio. Nas redes, o registro foi atribuído a diferentes estados, como São Paulo.

Facebook. Publicações que disseram ser atual e no Amazonas a foto de um caixão vazio tirada em 2007 em São Paulo, checadas por Aos Fatos, somavam ao menos 463.700 compartilhamentos no Facebook desde a manhã do dia 29 de abril até a tarde da última quarta-feira (6). A imagem não tinha qualquer relação com a Covid-19 e era relacionada a uma investigação da Polícia Civil paulista sobre fraudes em seguros de vida.

Apesar de as primeiras publicações terem sido feitas dia 29, foi durante o fim de semana que o assunto ganhou tração. Mais da metade dos compartilhamentos (265.100) ocorreu no sábado (2). Outros 102.200 foram feitos no domingo (3). Quase a totalidade deles foi veiculada em perfis pessoais no Facebook, e não por páginas públicas. Nenhum dos 56 posts analisados fazia menção a Carla Zambelli ou a outros políticos.

O pico de postagens no Facebook coincide com o pico de buscas pelo termo "caixões vazios" no Google, também no último fim de semana. Entre as buscas relacionadas ao termo aparecem consultas a outras notícias falsas relacionadas ao tema, como "caixões com pedras"; e também os termos "carla zambelli datena", em referência à entrevista que a deputada deu ao apresentador; e "carla zambelli fake news". Na prática, usuários que pesquisaram por "caixões vazios" também buscaram esses termos.

Os usuários de estados da região Norte foram os que mais buscaram pelos termos: Roraima, Tocantins, Amazonas, Rondônia e Amapá.

Outro lado. Radar Aos Fatos entrou em contato com a assessoria de imprensa da deputada Carla Zambelli. Em nota, ela afirmou que recebeu "duas fotos de dois cidadãos relatando registros do ocorrido em seus estados". Disse ainda que "a Constituição Federal garante expressamente, no artigo 53, a imunidade parlamentar, exatamente para que possamos fazer denúncias como a em questão sem qualquer preocupação de retaliação política". A parlamentar disse que "expôs publicamente esta situação com o objetivo de que a mesma seja investigada para comprovar, ou não, a possível fraude".

1. Rádio Bandeirantes
2. Aos Fatos 1 e 2.

Metodologia:

Foram capturados pela API pública do Twitter 84.245 tweets publicados entre os dias 27 de abril a 4 de maio que continham os seguintes termos:

"inspecionar caixões" ou "inspecionar os caixões" ou "conferir os caixões" ou "conferir caixões" ou "inspecionar caixoes" ou "inspecionar os caixoes" ou "conferir os caixoes" ou "conferir caixoes" ou "dentro do caixão" ou "dentro dos caixões" ou "dentro do caixao" ou "dentro dos caixoes" ou ((caixão ou caixões ou caixao ou caixoes) e ("nada dentro" ou vazio ou vazios ou pedras ou pedra ou "sem corpo"))

Foram selecionados os 50 tweets com mais popularidades (curtidas + RTs) dos dias 27 e 28 de abril, 29 e 30 de abril, 1 e 2 de maio e 3 e 4 de maio, para análise da narrativa em cada um dos períodos. A categorização dos tweets foi feita de maneira manual pela equipe do Radar Aos Fatos.

sobre o

Radar Aos Fatos faz o monitoramento do ecossistema de desinformação brasileiro e, aliado à ciência de dados e à metodologia de checagem do Aos Fatos, traz diagnósticos precisos sobre campanhas coordenadas e conteúdos enganosos nas redes.

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