🕐 ESTA REPORTAGEM FOI PUBLICADA EM Novembro de 2020. INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE TEXTO PODEM ESTAR DESATUALIZADAS OU TEREM MUDADO.

Checamos as declarações de Covas e Boulos no Roda Viva

Por Priscila Pacheco, Bernardo Barbosa, Amanda Ribeiro e Luiz Fernando Menezes

23 de novembro de 2020, 21h28

Os candidatos à Prefeitura de São Paulo Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL) foram entrevistados nesta segunda-feira (23) no Roda Viva, na TV Cultura. A equipe do Aos Fatos checou, ao vivo, as declarações feitas durante a transmissão.

Antes de iniciar os trabalhos de tempo real, a reportagem entrou em contato com as assessorias de imprensa dos candidatos para informá-las do processo de checagem. A equipe do Aos Fatos está aberta a observações, justificativas e eventuais correções nos momentos posteriores ao evento. Como se trata de um trabalho em tempo real, as checagens estarão sujeitas a eventuais revisões durante o debate e pelas horas que se seguirem.

Abaixo, acompanhe o que checamos. Clique no nome do candidato abaixo para acessar as checagens correspondentes.

1. Bruno Covas (PSDB)

2. Guilherme Boulos (PSOL)

1. Bruno Covas (PSDB)

FALSO

"O que aconteceu foi que a cidade de São Paulo durante esses quatro anos bateu um recorde, produzindo 85 mil vagas em creche." – Bruno Covas

A declaração de Covas foi classificada como FALSA, pois os números disponíveis nas bases de dados da prefeitura desde 2006 mostram que durante a gestão de Gilberto Kassab (PSD) foram criadas 104.377 vagas em creches, 18.877 a mais do que as 85.500 que o atual prefeito afirma ter criado. A declaração falsa também foi dita por Covas no debate da CNN.

O número da gestão Kassab é resultado da subtração das vagas registradas em dezembro de 2012 e dos registros de dezembro de 2008, quando ele foi reeleito. Já o dado do governo Covas consta do relatório do programa de metas atualizado em 12 de novembro deste ano, e fala em “mais de 85.500 vagas”. Questionada pelo Aos Fatos, a prefeitura não respondeu qual seria o número exato.

Outro lado. Por meio de nota, a assessoria do candidato afirmou que “até o final da gestão, serão totalizadas 85 mil vagas em creche criadas. 70% das famílias que ainda não foram contempladas com uma vaga recebem o auxílio-creche no valor de R$ 200. Para os próximos quatro anos nossa meta é zerar esse déficit, tanto com a criação de novas vagas nas creches municipais quanto por meio de parcerias com instituições privadas. A gestão Kassab considerou 6 anos de gestão”.

A checagem do Aos Fatos sobre a administração de Gilberto Kassab, porém, levou em conta, como consta no texto acima, apenas o período de dezembro de 2008 a dezembro de 2012.


FALSO

“A gente tinha em 2017 um rombo orçamentário de R$ 7 bilhões.” - Bruno Covas

A declaração de Covas foi considerada FALSA, pois o Relatório Anual de Fiscalização de 2016 publicado pelo TCM-SP (Tribunal de Contas do Município de São Paulo) aponta que em 2016 foi deixado no caixa da prefeitura um saldo de R$ 5,3 bilhões e despesas financeiras de curto prazo no valor de R$ 2,1 bilhões. Segundo o documento, “se todas essas obrigações fossem pagas, restaria um saldo da ordem de R$ 3 bilhões”. O candidato repete o discurso da gestão de João Doria (PSDB), de quem foi vice-prefeito. À época, o antecessor no cargo, Fernando Haddad (PT), argumentou que a acusação estava relacionada a uma frustração de receita, não a um rombo.

O economista André Luiz Marques, coordenador do Centro de Gestão e Políticas Públicas do Insper, explica que rombo e frustração de receita são variantes diferentes. “O rombo é como se já tivesse sido consumado: terminei o ano e tenho mais dívidas a pagar do que receitas. Por exemplo, tenho 100 no caixa, mas, nas contas a pagar, 120. Então, já estou devendo 20”, diz.

Já a frustração de receita seria quando uma projeção de orçamento não se realiza como prevista, seja por fatos que exigiram mais gastos ou que interferiram na arrecadação. Segundo o economista, uma frustração de receita pode gerar um rombo orçamentário no decorrer do tempo, mas não que o rombo já veio da gestão anterior.

Em nota enviada ao Aos Fatos em outubro, a prefeitura afirmou que a principal frustração na ponta das receitas foi verificada nas transferências de capital da União: de R$ 2,7 bilhões previstos, apenas R$ 642 milhões chegaram aos cofres municipais. Na parte das despesas, a prefeitura afirma que o orçamento para subsídio ao transporte público, estimado em apenas R$ 1,8 bilhão para o ano, atingiu R$ 2,9 bilhões em 2017.

De acordo com o TCM-SP, a gestão de Haddad teve uma queda de 8% nas receitas e um aumento de 1,8% nas despesas em meio à recessão econômica de 2016. No entanto, a liberação de R$ 1,7 bilhão em depósitos judiciais não tributários e a renegociação de dívidas com a União reforçaram o caixa. Sem isso, a situação “teria ficado bastante comprometida”, segundo afirma o relatório, no tópico “Gestão Financeira”.

Outro lado. Em nota, a assessoria de Covas afirma que o orçamento "deixado pela gestão Haddad para o ano de 2017, primeiro do atual governo, era irrealista e maquiado. Exagerava as receitas em R$ 5 bilhões e subestimava as despesas em R$ 2,5 bilhões. Ou seja, tinha um buraco de mais de R$ 7 bilhões".

E completa: "A quase totalidade dos recursos deixados em caixa no fim do exercício de 2016 estavam comprometidos com pagamentos de curto prazo. Eram insuficientes, portanto, para cobrir o rombo decorrente do descasamento entre receitas superestimadas e despesas subestimadas expressas no orçamento legado pela gestão petista".


VERDADEIRO

“Hoje 20% das pessoas internadas na cidade de São Paulo são de fora da cidade.”

É VERDADEIRA a declaração de Bruno Covas. De acordo com um levantamento da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), publicado em outubro pelo site R7, cerca de 17% dos pacientes internados na cidade de São Paulo não residem na capital paulista. É um percentual similar às hospitalizações em instituições particulares, segundo outro balanço, realizado pela revista Veja. Na última segunda-feira (16), em torno de 25% das pessoas internadas em seis hospitais da rede privada da cidade eram de fora da capital.


VERDADEIRO

“Ricardo [Nunes] não responde nem sequer a um processo judicial que envolva qualquer tipo de beneficiamento em relação a ele.” – Bruno Covas

A declaração é VERDADEIRA. A fala de Covas se referia a suspeitas de irregularidades em aluguéis de creches pelo município envolvendo o candidato a vice em sua chapa, Ricardo Nunes (MDB). Na consulta processual do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), não foram encontrados processos em andamento contra Nunes. De acordo com as certidões criminais entregues à Justiça Eleitoral, o político não responde a processos judiciais no momento. Segundo uma das certidões, Nunes já respondeu a dois processos na Justiça Estadual de São Paulo, mas ambos foram arquivados (aqui e aqui).


VERDADEIRO

"A cidade tem até um decreto municipal de minha autoria reconhecendo o racismo estrutural, apontando políticas para resolver isso na cidade de São Paulo." – Bruno Covas

A declaração é VERDADEIRA. No dia 9 de setembro, Covas publicou o decreto 59.749, que cria a Política Municipal de Prevenção e Combate ao Racismo Institucional. O texto prevê a criação de um Comitê de Prevenção e Combate ao Racismo Institucional e de um canal de atendimento a vítimas de discriminação racial “ocorrida em relações laborais no âmbito da Administração Pública Municipal”, entre outras medidas.


2. Guilherme Boulos (PSOL)

FALSO

“Existe uma lei federal que propõe, que prevê, na verdade, o ensino de história africana e cultura afro-brasileira nas escolas há 15 anos. Ela não foi implementada na rede municipal de São Paulo.” - Guilherme Boulos

De fato, as leis federais 10.639, de 2003, e 11.645, de 2008, determinam a obrigatoriedade do estudo da história e da cultura afro-brasileira e indígena nos ensinos fundamental e médio de colégios públicos e privados no país. É FALSO, no entanto, que essa determinação não tenha sido aplicada na rede municipal de ensino de São Paulo, como afirma o candidato Guilherme Boulos. O atual Currículo da Cidade e materiais pedagógicos de apoio orientam a abordagem da temática em sala de aula e a imprensa já noticiou casos de colégios municipais que incorporaram o ensino de história africana e afro-brasileira.

O atual Currículo da Cidade, que embasa o trabalho pedagógico nas escolas, é de 2019 e prevê o ensino da cultura de povos africanos e afro-brasileiros. No segundo ano do ensino fundamental, por exemplo, as crianças devem estudar a história das brincadeiras e dos jogos coletivos de que participam, “incluindo os pertencentes aos povos indígenas e os que estabelecem vínculos com diferentes matrizes afro-brasileiras e africanas”.

No sétimo ano, os estudantes devem aprender sobre “os saberes de povos africanos e pré-colombianos”, as “relações sociais e hibridismo cultural” e os modelos de conquista colonial e implantação da escravização indígena e africana no Brasil. No nono ano, há previsão de ensino da história do movimento negro, da descolonização da África e da Ásia e a da conexão da cultura brasileira com países africanos e de língua portuguesa, entre outras temáticas.

Um documento de apoio do Currículo da Cidade, que traz orientações pedagógicas complementares por disciplina, sugere atividades e abordagens em sala de aula que contemplem a temática racial durante as aulas de História no ensino fundamental, por exemplo.

Em reportagem da Folha de S.Paulo de 2019 que discutia a implantação irregular do ensino sobre a cultura e a história africanas nas escolas municipais brasileiras, são citados ainda exemplos de unidades paulistanas que aplicaram o ensino em suas matrizes curriculares: a Nelson Mandela, na zona norte, usa brincadeiras para abordar temas como racismo, a explicação biológica sobre diferenças na cor da pele, entre outros temas. Em outro colégio, do centro da cidade, histórias em quadrinhos são usadas para mostrar a realidade do continente africano que vai além da escravidão.


IMPRECISO

"O déficit da previdência municipal está estável, ele existe, mas ele não cresce, no último período. Ele está estável em torno de R$ 5 bilhões." - Guilherme Boulos

É IMPRECISO dizer que o déficit da previdência municipal não cresce e que está estável, porque ele apresentava tendência de crescimento de 2016 a 2018 e, após uma queda por conta da reforma previdenciária municipal, tem previsão de voltar a subir. Em 2020, segundo especialistas, a diferença entre as contribuições patronais e de servidores e o pagamento de aposentadorias deve registrar déficit de R$ 5,9 bilhões. No ano passado, ele foi de R$ 5,4 bilhões (R$ 5,7 bilhões corrigidos pelo IPCA de outubro), segundo os dados do boletim estatístico do RPPS (Regime Próprio de Previdência Municipal) de São Paulo.

De 2016 a 2018, o déficit da previdência municipal passou de R$ 3,8 bilhões (R$ 4,34 bilhões em valor corrigido pelo IPCA de outubro) para R$ 5,5 bilhões (5,8 bilhões no valor corrigido pela inflação). Entre 2018 e 2019, no entanto, houve uma queda. Segundo o relatório de 2019 do TCM (Tribunal de Contas do Município) de São Paulo, ela foi resultado da reforma da previdência municipal sancionada em 2018, que aumentou a alíquota da contribuição dos servidores e implementou a Previdência Complementar para os novos ingressantes. "Somente em 2019, o déficit da previdência foi reduzido em R$ 326 milhões devido ao aumento da alíquota do servidor", aponta o relatório. Para 2020, a economia prevista pelo tribunal é de R$ 420 milhões.

Na proposta de governo apresentada ao TSE, Boulos afirma que enviará um projeto de lei à Câmara Municipal para revogar a lei 17.020/2018, que implementou a reforma previdenciária municipal.


IMPRECISO

“R$ 19 bilhões parados em caixa como nós temos.” - Guilherme Boulos

O valor apontado pelo candidato corresponde ao chamado caixa e equivalentes de caixa, nome dado aos recursos que se encontram nas contas do Tesouro Municipal. De acordo com o TCM-SP (Tribunal de Contas do Município de São Paulo), eram R$ 19,1 bilhões em agosto. Esse recurso, no entanto, não está parado. Cerca de R$ 8,2 bilhões já têm destinação definida e estão vinculados a fundos para financiar gastos de áreas como educação. Por isso, a declaração foi considerada IMPRECISA.

É fato, no entanto, que a desvinculação de recursos para o combate à pandemia é possível, desde que os valores estejam alocados em fundos específicos. Em março deste ano, a prefeitura sancionou uma lei que permitiu a desvinculação das receitas de 11 fundos municipais para o uso dos recursos no combate à pandemia de Covid-19. Em decreto publicado no mês seguinte que regulamenta a medida, foram desvinculados 100% das receitas totais do exercício de 2020 e do superávit financeiro de 2019 desses fundos.

Além disso, os gastos adicionais e a perda de arrecadação podem deixar as contas do município com um déficit nas contas públicas de até R$ 10 bilhões no fim do ano, de acordo com o prefeito, Bruno Covas. O valor seria consequência de uma queda de R$ 7 bilhões em arrecadação e o gasto de R$ 2,6 bilhões em ações voltadas ao combate à Covid-19.


VERDADEIRO

“Um dos pontos que está no nosso programa de governo, que foi construído em parceria com militantes e ativistas do movimento negro (...) é a recriação da Secretaria de Igualdade Racial, que o [João] Doria e o Bruno Covas acabaram com ela em São Paulo.” - Guilherme Boulos

A declaração de Guilherme Boulos é VERDADEIRA. Ao assumir a Prefeitura de São Paulo em janeiro de 2017, João Doria (PSDB) diminuiu o número de secretarias municipais de 27 para 22. Entre as pastas extintas estava a de Promoção da Igualdade Racial, criada em 2013 durante a gestão de Fernando Haddad (PT). Atualmente, há uma Coordenação de Promoção da Igualdade Racial que integra a Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania desde 2018. Também é verdade que em seu programa de governo Boulos cita que pretende recriar a secretaria.


VERDADEIRO

“Tem 25 mil pessoas morando nas ruas na cidade de São Paulo.” - Guilherme Boulos

A declaração do candidato VERDADEIRA. De acordo com a versão mais recente do Censo da População em Situação de Rua elaborado pela Prefeitura de São Paulo, havia, em 2019, 24.344 pessoas morando nas ruas da cidade.

É importante salientar, no entanto, que os números em 2020 podem ter crescido substancialmente por conta da pandemia de Covid-19. Relatos de instituições de amparo à população sem-teto em maio apontavam o aumento no número de pessoas que buscavam abrigos ou refeições. Em entrevista ao G1, uma tenda de serviço franciscano que oferece assistência à população em São Paulo relatou um crescimento no número de refeições diárias servidas de 50 em março para 2.500 em maio.


Esta reportagem foi publicada de acordo com a metodologia anterior do Aos Fatos.

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